Miguel Viegas, Jornal i online

Em Portugal, vários estudos estimam um custo em perdas de receitas fiscais associados à fraude e evasão entre 10 e 15 mil milhões de euros anuais. Não deixa de causar alguma perplexidade que este tema não seja abertamente discutido em campanha eleitoral

Em plena pré-campanha eleitoral para as próximas eleições legislativas de 19 de maio 2025, pouco ou nada se tem discutido sobre o combate à fraude e evasão fiscal. Esta lacuna é de lamentar na medida em que por um lado, passa ao lado das negociações em fiscalidade internacional onde tem havida alguns avanços, e por outro, permitiria sustentar maior ambição nas muitas propostas avançadas pelos diferentes partidos em termos de políticas públicas. Neste artigo, vamos elencar algumas das principais questões em matéria de combate à fraude e evasão fiscal que gostaríamos de ser debatidas nesta campanha eleitoral, contribuindo assim para que se conheça melhor as propostas de cada partido nestas questões tão relevantes para as nossas sociedades.

Com a multiplicação de vários escândalos financeiros quase todos provocados a partir de denuncias de lançadores de alerta, ficou claramente exposto ao longo das últimas décadas, o quadro internacional altamente permissivo que têm permitido às grandes empresas multinacionais fugir ao pagamento de impostos, privando assim os estados de recursos importantíssimos para enfrentar os vários desafios societais. Desde então, temos assistido a múltiplas negociações em vários fóruns internacionais com o objetivo de construir instrumentos de cooperação à escala internacional para garantir que os impostos são pagos no local onde são gerados os lucros. Destas negociações importa sublinhar alguns avanços significativos ao nível da transparência com destaque para a obrigatoriedade das grandes empresas multinacionais publicarem anualmente um relatório com informação desagregada por países (“Country by Country Report”) e para a troca automática de informações entre jurisdições fiscais. Estes avanços permite-nos hoje conhecer melhor a dimensão do fenómeno com o qual estamos a lidar e vincula todos os governos a agir de forma consequente uma vez que é hoje impossível ignorar.

De acordo com dados divulgados pelo EUTAX Observatory, os paraísos fiscais continuam a esconder uma grande parte da riqueza mundial, com uma tendência crescente visível na Figura 1. Ou seja, ativos num valor que ascende a mais de 12% do PIB mundial, escapam hoje ao controlo das autoridades tributárias. De acordo com o último relatório publicado pelo EUTAX (Stiglitz, J., Alstadsaeter, A., Godar, S., Nicolaides, P., & Zucman, G. (2024). GLOBAL TAX EVASION REPORT 2024. EU Tax Observatory. https://www.taxobservatory.eu/about), as deslocalizações artificiais de lucros para paraísos fiscais representam uma perda de 20% do total das receitas fiscais dentro da União Europeia. Em Portugal, vários estudos estimam um custo em perdas de receitas fiscais relacionados com a fraude e evasão entre 10 e 15 mil milhões de euros anuais. Não deixa de causar alguma perplexidade que este tema não seja abertamente discutido em campanha eleitoral.

São várias as perguntas que poderiam ser colocadas aos candidatos dos vários partidos. O combate à fraude e evasão fiscal é ou não uma prioridade e qual o valor real que pensam poder recuperar na aplicação dos seus programas? O que fazer perante os 6 a 7 mil milhões de euros que saem do país todos os anos para paraísos fiscais? Estão dispostos taxar o lucro à saída quando existe forte suspeita de uma empresa deslocalizar lucros para paraísos fiscais? Estão previstas penalizações para bancos que mantem atividades em paraísos fiscais? Finalmente, seria igualmente importante perceber até quanto cada partido está disposto a ir no reforço em meios técnicos e humanos a autoridade tributária, num mundo cada vez mais globalizado e digitalizado.