Sofia Nair Barbosa, Jornal i online
Não há legislação específica em nenhum país do mundo que trate exclusivamente do ChatGPT ou de tecnologias semelhantes
Atualmente, vivemos num mundo em que a tecnologia é uma constante presença nas nossas vidas, que molda e transforma o mundo em que vivemos. Desde a Revolução Industrial, a tecnologia tem impulsionado o desenvolvimento económico e social, gerando novas possibilidades para diversas áreas de atuação (negócios, comunicação, produção, entre outras). O surgimento da computação, da internet e da inteligência artificial (IA) fez com que a tecnologia alcançasse um novo patamar de influência e impacto, mudando a forma como interagimos, trabalhamos, aprendemos e nos relacionamos uns com os outros. A tecnologia permite que as pessoas se conectem instantaneamente, fornece-nos informações instantâneas e acessíveis, ajuda-nos a resolver problemas complexos e oferece-nos novas formas de criar e explorar.
Existem muitas tecnologias que foram consideradas revolucionárias antes do surgimento do ChatGPT (Chat Generative Pre-trained Transformer), algumas das quais transformaram a forma como vivemos. Passo a destacar algumas destas tecnologias: i) Internet: a capacidade de comunicarmos e trocarmos informações instantaneamente em todo o mundo mudou a forma como interagimos, trabalhamos e nos divertimos; ii) Computadores pessoais: a disponibilidade de computadores individuais e de simples manuseamento, permitiu uma revolução ao nível da indústria de software permitindo que as pessoas realizem tarefas, que antes do seu aparecimento, eram impossíveis de executar; iii) Smartphones: a capacidade de nos conectarmos com a internet em qualquer lugar, a qualquer momento, e realizar uma variedade de tarefas num dispositivo portátil mudou a forma como vivemos e comunicamos; iv) Energia elétrica: a capacidade de gerar e distribuir eletricidade em larga escala permitiu a criação de novas indústrias e transformou o quotidiano de milhões de pessoas, e entre outras.
Em 2019, surge então uma revolucionária tecnologia - o ChatGPT. O ChatGPT trata-se de uma tecnologia de IA criada pela OpenAI que tem como propósito fornecer uma forma interativa e natural para que os utilizadores possam aceder a informações, respondam a perguntas e mantenham conversas. Esta ferramenta foi testada numa ampla gama de dados de linguagem natural, nomeadamente: notícias, livros, artigos de enciclopédia e publicações de redes sociais. Pode ser aplicada em diversos contextos, desde assistentes virtuais em sites de comércio eletrónico e até em chatbots de suporte ao cliente. É capaz de responder a perguntas, fornecer informações, completar frases e até mesmo criar diálogos coerentes. O objetivo final é ajudar as pessoas e as organizações a obterem informações de maneira mais rápida, fácil e aprimorar a interação humana com a tecnologia.
Por outro lado, apesar de toda a potencialidade positiva do ChatGPT, existem alguns riscos que devem ser considerados, nomeadamente: 1) O ChatGPT é uma tecnologia que funciona a partir de grandes quantidades de dados textuais disponíveis na internet, o que significa que pode reproduzir preconceitos ou estereótipos presentes nesses mesmos dados. Isso pode levar a respostas e recomendações tendenciosas, que podem ser prejudiciais para um determinado grupo de pessoas; e 2) É uma tecnologia que ainda está em crescimento, o que significa que pode não ser capaz de entender ou responder a todas as perguntas de forma precisa e eficaz, o que pode levar a respostas incompletas ou erróneas, podendo influenciar negativamente decisões importantes; 3) Não substitui totalmente a interação humana, uma vez que existem muitas nuances em conversas e situações, que apenas os seres humanos são capazes de compreender e responder adequadamente; 4) é necessário que as instituições ou pessoas que utilizam a ferramenta estabeleçam limites claros para o seu uso e considerem cuidadosamente como o mesmo será integrado nas suas operações e processos de tomada de decisão; e 5) inexistência de legislação específica para a utilização do ChatGPT.
De acordo com a pesquisa efetuada, até ao momento não há legislação específica em nenhum país do mundo que trate exclusivamente do ChatGPT ou de tecnologias semelhantes. No entanto, existem algumas leis e regulamentações mais amplas que podem aplicar-se à utilização do ChatGPT em determinados contextos.
Em Portugal existe legislação específica que aborda a privacidade e proteção de dados pessoais, que se aplica a tecnologias como o ChatGPT. No ordenamento jurídico português é a Lei de Proteção de Dados Pessoais (Lei nº 58/2019), que foi implementada em resposta às exigências do Regulamento Geral de Proteção de Dados (RGPD) da União Europeia.
A lei portuguesa estabelece regras para a recolha, utilização, processamento e armazenamento de dados pessoais, incluindo os dados obtidos por meio de tecnologias de IA, como o ChatGPT. Além disso, a legislação estabelece direitos para os indivíduos relativamente aos seus dados pessoais, como o direito de acesso, correção, exclusão e portabilidade.
Importa ainda referir que a utilização do ChatGPT em Portugal deve estar em conformidade com as regras estabelecidas pela legislação de proteção de dados pessoais e outras leis aplicáveis, como a Lei de Propriedade Intelectual. As organizações que utilizam o ChatGPT devem estar conscientes das suas obrigações legais e tomar medidas adequadas para proteger a privacidade e segurança dos dados pessoais dos utilizadores.
São vários os organismos que se têm debruçado sobre as discussões ético-deontológicas e regulamentares relacionadas com o ChatGPT, incluindo os governos, organizações da sociedade civil, universidades e empresas. Em Portugal, podemos orientar-nos pelas seguintes fontes: a) Comissão Nacional de Proteção de Dados (CNPD); b) Centro Internet Segura (CIS); c) Iniciativas académicas: Algumas universidades portuguesas, têm programas de pesquisa e ensino em ética e regulação de tecnologia, por exemplo a Universidade do Porto e de Lisboa (entre outras); e d) organizações da sociedade civil: por exemplo a Associação Portuguesa de Ética e Filosofia Prática e a Associação D3 - Defesa dos Direitos Digitais.
De notar que os temas relacionados com a ética e regulação da tecnologia estão em constante evolução, podendo surgir novas iniciativas e novas fontes de informação, ao longo do tempo.
Em suma, acredito que o ChatGPT é uma grande inovação tecnológica, na medida que pode promover a eficiência e soluções rápidas no que concerne ao mundo organizacional (público e privado). Na minha perspetiva, Portugal sendo um país que já adota tecnologias de inteligência artificial em diversas áreas, poderá aderir facilmente ao ChatGPT nas diversas áreas – justiça, saúde, finanças, serviços públicos e entre outros. Recentemente, foi divulgado que esta ferramenta irá ser aplicada ao Ministério da Justiça em Portugal, no sentido de tirar dúvidas a cidadãos e empresas sobre processos judiciais, no que concerne, a situações de planeamento familiar, direito no trabalho e entre outros temas pertinentes para a sociedade. Considero que esta implementação é bastante positiva, pois subsistimos num mundo tão volátil e com imensa informação em constante mutação e a criação desta chatbox, por parte do Ministério da Justiça, irá promover e colaborar com a justiça social e económica do país. Este exemplo, para mim significa uma evolução em termos de mentalidades e um apelo à partilha informação de fácil acesso a todas as pessoas, não negligenciando o seu uso consciente e responsável.