Miguel Abrantes, Jornal i
Nos últimos anos ocorreram vários escândalos a nível internacional relacionados com offshores
Quando nos é apresentada uma conjetura perversa mas pouco credível, que alegadamente está por detrás de factos que aparentemente nos parecem normais, dizemos que estamos perante uma teoria de conspiração. Mas quando essa conjetura representa a realidade, estamos perante uma realidade de conspiração.
Estas realidades sucedem frequentemente quando estamos perante jurisdições, conhecidas por offshores,nas quais se aplicam regras diferentes daquelas que são aplicáveis à generalidade dos países.
Em regra, as referidas jurisdições encontram-se em territórios com pouco potencial económico e a sua criação é apresentada como tendo o objetivo de incrementar o desenvolvimento das condições sociais e económicas dos residentes. Todavia esses objetivos, na quase totalidade dos casos, não são alcançados. Na prática, os únicos investimentos que são realizados consubstanciam-se no arrendamento de alguns andares que funcionam com sede social de centenas de empresas.
Noutros casos, em menor número, existem países ricos do hemisfério Norte que, embora não necessitem de ter uma jurisdição generosa em termos fiscais para terem sucesso económico, na prática, comportam-se como verdadeiros offshores.
Em ambos os casos, as pessoas individuais ou coletivas que utilizam as particularidades destes territórios nem sempre as utilizam de uma forma legítima.
Em muitas circunstâncias o que está por detrás da referida utilização representa verdadeiras realidades de conspiração. Com efeito, a opacidade que é caraterística dos offshores serve, por vezes, para ocultar montantes provenientes de atos de corrupção, de desvio de fundos e do tráfico de droga, armas e diamantes.
O conceito de offshore foi incrementado em Londres após a crise do Canal do Suez em 1956. Na sequência da nacionalização desta infraestrutura pelo Presidente Egípcio Gamal Abdel Nasser, Israel, a Inglaterra e a França declararam guerra ao Egipto. Uns dias depois, o presidente dos Estados Unidos, Dwight Eisenhower, «obrigou» estes países a concordar com um cessar-fogo e, consequentemente, a abandonarem as zonas ocupadas no Egipto.
Na sequência da crise política e económica que afetou a Inglaterra depois da denominada crise do Canal Suez, o banco central deste país decidiu criar um espaço que atraísse capitais especulativos e, desta forma, revitalizar o seu sistema financeiro. Para o efeito, aprovou legislação nos termos da qual as transações efetuadas entre duas partes que não estivessem sediadas em território inglês, eram consideradas como se tivessem sido realizadas no exterior, em offshore.
Nos últimos anos ocorreram vários escândalos a nível internacional relacionados com offshores revelados pelo International Consortium of Investigative Journalists (ICIJ), designadamente: o Lux leaks que foi revelado em novembro de 2014 e teve origem em informação confidencial sobre o sistema fiscal do Luxemburgo; o Swiss Leaks que foi revelado em fevereiro de 2015 através arquivos retirados da subsidiária em Genebra do Hong Kong and Shanghai Banking Corporation (HSBC) por um antigo funcionário desta instituição; e o Panamá Papers revelado em abril de 2016 com a divulgação de um conjunto de 11,5 milhões de documentos produzidos por uma sociedade de advogados denominada Mossack Fonseca localizada na cidade do Panamá. Estes documentos divulgaram informações sobre de 214.000 empresas sediadas em paraísos fiscais.
Em Portugal, segundo o Relatório de Combate à Fraude e à Evasão Fiscal, em 2019, no âmbito de uma ação que visou averiguar a proveniência de montantes transferidos para offshores, efetuaram-se trinta e três ações de investigação dirigidas fundamentalmente a advogados que intermedeiam negócios entre residentes e não residentes. No âmbito das referidas investigações foram apurados rendimentos não declarados em sede de IRS no montante de um milhão e quatrocentos mil euros.
Independentemente da relevância financeira dos montantes em causa, é importante apurar qual o motivo que levou cidadãos nacionais a enviar fundos para jurisdições offshore sem terem efetuado a respetiva declaração à administração fiscal.
Em condições normais, quando é realizada uma operação financeira legítima, de qualquer natureza, a mesma é declarada às autoridades tributárias.