Alexandre Almeida, Jornal i
A falta de transparência continua a ser um problema endémico do nosso sistema político
O Bom! O Novobanco surgiu como o banco do “ar puro”, sem ativos tóxicos e limpo das imparidades mais graves, viável e que, pese embora uma necessária recapitalização e apoio estatal, seria a solução para o caso BES. Todavia, os resultados do Banco, as recentes operações de alienação imobiliária e os resultados da auditoria da Deloitte mostram que o “Bom” ainda tinha um fundo “Mau” e que talvez Ricardo Salgado não seja o único “Vilão” deste filme. Nem a tentada confundibilidade entre Banco Espírito Santo (BES) e Novobanco, nem a constante dicotomia criada entre o passado nefasto e o augurado casto presente e futuro, conseguem justificar a falta de controlo e de transparência deste processo.
O Mau! A falta de transparência continua a ser um problema endémico do nosso sistema político, particularmente, preocupante quando se trata de questões que geram preocupação generalizada nos portugueses e suscitam a desconfiança no sistema político. No caso do Novobanco, não obstante os portugueses serem ainda hoje acionistas indiretos e financiadores diretos do Novobanco, os seus direitos de supervisão estão coartados, seja por dificuldades das próprias instituições encarregues dessa tarefa, seja porque o acesso à informação permanece reservado e pouco transparente. Mas este é um problema de saúde societal e que não se circunscreve a este caso. De facto, mesmo no caso da pandemia COVID-19, da necessária e unânime manutenção da confiança dos portugueses no estado e nas suas instituições e, em particular, da igualmente fundamental mobilização de todos para a adoção de comportamentos responsáveis, assistimos a uma crescente falta de transparência com impactos diretos nos níveis de alarme social. As diretrizes titubeantes e aparentemente incoerentes quanto à realização de eventos e, em particular, o secretismo e a relutância na divulgação das recomendações da Direção Geral da Saúde (DGS) para a organização da Festa do Avante é incompreensível e aceitável, gerando um foco de alarme social desnecessário e evitável. Esta falta de transparência, independentemente da justeza ou não das críticas, contamina a crença dos portugueses na instituição e estigmatiza como vilã a Festa do Avante.
O Vilão! O Partido Comunista Português (PCP) tornou-se o vilão do regresso às aulas. Justa ou injustamente, legitimamente ou não, a falta de transparência deste processo e o alarme social suplantaram, momentaneamente, as outras preocupações das famílias portuguesas. A Festa do Avante tornou-se a novela em torno da qual percebemos bem os impactos negativos da falta de coerência e transparência. Discordo que, atendendo a todas as restrições impostas aos demais eventos e às próprias famílias, se permita a realização de eventos desta dimensão. Mas o mais relevante disto é que a falta de transparência e novamente o secretismo que envolve as recomendações de saúde pública da DGS, lançam a dúvida sobre a racionalidade e imparcialidade das decisões da DGS, beliscam a credibilidade das instituições, suscitando dúvidas dispensáveis. O PCP será ainda mais vilificado se algo correr mal, mas não será o único.
No mítico filme de Sergio Leone, o “Bom”, o “Mau” e o “Vilão”, a trama demonstra como a falta de transparência mina a credibilidade e impacta negativamente na sociedade. A transparência e uma eficaz comunicação são fundamentais para uma adequada consciência social e julgamento político, sem os quais a quebra de confiança nas instituições conduz a uma diabolização, potencia movimentos extremistas e promove a abstenção eleitoral que apenas é preocupação em vésperas e na noite de eleições.