Jorge Fonseca de Almeida, Dinheiro Vivo
A sociedade portuguesa é diversa e essa diversidade acompanha-nos desde a fundação da nacionalidade. Quando D. Afonso Henriques declarou a independência de Portugal grande parte da população do que é hoje a nossa faixa continental era habitada por mouros, uma grande parte dos quais eram negros. Também os ciganos se encontram entre nós desde há vários séculos.
E no entanto… ao olharmos para os Conselhos de Administração das grandes empresas portuguesas, para os lugares de topo da função pública, para as profissões mais respeitadas como os juízes, os professores universitários, para os comandantes das Forças Armadas, para tantas e tantas outras posições, essa diversidade esvanece-se, evapora-se, desaparece e o que vemos é uma esmagadora maioria de homens brancos, pontilhada por uma presença crescente de mulheres igualmente brancas.
Em contrapartida nos empregos mais precários, nas profissões mais duras, nas populações mais pobres vemos aglomerar-se uma desproporção gritante de membros das minorias étnicas e raciais.
Ao sistema que polariza e agrupa as pessoas desta forma injusta e desumana chamam os especialistas racismo institucional ou estrutural. E não adiantam as manifestações extremistas e hipócritas, as juras de amizade, os beijos do Presidente, as negações dos políticos da direita e da esquerda, os factos falam por si. Não há volta a dar. Portugal é mesmo um país estruturalmente racista, como mostram os diversos estudos sociológicos europeus e internacionais. E não se demonstra em toda a extensão da injustiça porque vergonhosamente o Estado português não autoriza que se recolham os dados estatísticos que o provariam.
Este racismo institucional, vem agora comprovar a Mckinsey, insuspeita consultora internacional norte-americana, tem consequências graves ao nível do desenvolvimento económico. Desde logo porque coarta a criatividade, bem essencial na economia moderna, e diminui o empenhamento e a produtividade dos empregados que sentem não terem possibilidade de ser reconhecidos façam o que fizerem. Mas não só os que são diretamente discriminados mas também os outros que sentem a injustiça mas sabem que basta ser branco para ultrapassar o vizinho negro ou cigano não sendo necessário mais empenhamento.
E a discriminação inevitavelmente torna-se conhecida e tem consequências. As encomendas baixam, ninguém quer ter um fornecedor racista, ninguém quer comprar um produto que incorpore partes produzidas por companhias ou países racistas. Grande parte das pessoas que saíram à rua nas gigantescas manifestações antirracistas, por ocasião do assassinato de George Floyde, eram … brancas.
Lembram-se dos cancelamentos de encomendas e da mudança de fornecedores que as empresas de sapatos e têxteis sofreram por causa do trabalho infantil que Portugal teimava em não combater, explicando ridícula e vergonhosamente ao mundo que essa prática fazia parte da cultura nacional? Quanto custou então ao país esse fingido traço cultural.
Os grandes mercados norte-americano, europeu e chinês estão, afirma a Mckinsey, cada vez mais alerta e cada vez mais vigilantes em relação ao racismo. As empresas portuguesas têm de mudar de vida se querem continuar a exportar e a manter posições nos mercados estrangeiros. Hoje com a sua postura, Portugal corre o risco de ser alvo de campanhas de boicote antirracista em vários países. É preciso mudar. Com a rapidez que hoje, na era digital, se espera.
E não se desculpem com séculos de convivência porque o que todos recordam no estrangeiro é da guerra colonial e da recusa de aceitar a independência dos países africanos, igualmente com base no argumento cultural. Desculpas que a ninguém a enganaram então e não enganam agora.
* Jorge Fonseca de Almeida, economista, MBA