Carlos Pimenta, Dinheiro Vivo (JN / DN)
Quanto mais conhecermos e agirmos - em democracia - melhor estaremos em condições de debelar as fraudes, com mais Estado, mais fiscalização
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A ACFE - Association of Certified Fraud Examiners é, como o nome indica uma Associação de Investigadores de Fraude Certificados, fundada em 1988, com sede em Austin, EUA. Reconhecida internacionalmente como uma das principais organizações sistematicamente empenhadas na promoção de uma política antifraude, sobretudo nas empresas, tem hoje associados ou filiais em muitos países, embora predomine o espaço anglo-saxónico, mais propenso a esta acção.
Porque sentiram a necessidade de uma informação objectiva e quantificada sobre a realidade da fraude, desde 1966 que fazem análises da situação, tendo publicado muito recentemente o seu 11º estudo, com um âmbito crescentemente internacional. “Este estudo [Report to the Nations 2020] contém uma análise de 2.504 casos de fraude ocupacional que foram investigados entre Janeiro de 2018 e Setembro de 2019. Esta é uma pequena fracção do número de fraudes cometidas todos os anos contra milhões de empresas, organizações governamentais e sem fins lucrativos em todo o mundo.”
Tratando-se apenas da fraude ocupacional, embora nas dezenas de formas que esta pode assumir, convém desde já precisar o conteúdo desta: resulta da “utilização da sua actividade profissional para enriquecimento pessoal [(sós ou em conluio)] através da utilização indevida ou inadequada dos recursos ou bens da organização em que trabalham”.
Os casos de fraude anteriormente quantificados são de 125 países, embora a cobertura seja muito maior da zona norte do continente americano, com 46% dos casos. Tal deve permitir deduzir que o panorama é ainda mais grave em regiões com menor hábito e menos quadros especialista em combate à fraude, onde se inclui indubitavelmente o nosso país.
Os casos estudados apontam para uma perda superior a 3.600.000.000 de dólares (dos EUA), representando uma perda média de 1.509.000 por fraude ocupacional, o que significa, nestes casos, uma perda pelas empresas de pelo menos 5% dos seus rendimentos. Dizemos «pelo menos» porque as fraudes detectadas já existiam pelo menos há 14 meses, pelo que é de admitir que nessas organizações também existissem, e existam, outras fraudes, algumas das quais poderão nunca ser detectadas.
Para a generalidade dos sectores de actividade tipificaram as fraudes existentes, embora cada caso tenha uma série de idiossincrasias que podem exigir especificidades na politica antifraude, seja preventiva ou de obtenção de provas. É o que habitualmente é designado por árvore da fraude.
Nesta consideram numa primeira divisão três grandes tipos:
- Corrupção: fraude em “que um trabalhador utiliza indevidamente a sua influência numa transacção comercial de forma a violar o seu dever para com o empregador, a fim de obter um benefício directo ou indirecto”
- Apropriação Indevida de activos: quando “um trabalhador rouba ou utiliza indevidamente os recursos da organização empregadora (por exemplo, roubo de dinheiro da empresa, esquemas de facturação falsas ou relatórios de despesas inflacionados)”
- Relatórios financeiros fraudulentos: quando “um trabalhador causa intencionalmente uma declaração falsa ou uma omissão substantiva de informação nos relatórios financeiros da organização (por exemplo, registando receitas fictícias, subestimando as despesas ou inflacionando artificialmente os activos reportados)”.
É sabido que a grande maioria dos funcionários das diferentes empresas são honestos e não cometem fraudes, mas, como vimos, bastam alguns, por vezes muito poucos, para gerarem grandes prejuízos, os quais são transversais a todo o tipo de instituições (multinacionais e pequenas empresas, com ou sem fins lucrativos).
A corrupção é o tipo de fraude mais habitual em todas as regiões do globo. A apropriação indevida de activos é o tipo mais comum de fraude (podendo ser cometida de muitíssimas formas) representando 86% dos casos, mas são as poucas fraudes nos relatórios financeiros (geralmente realizada por entidades com bastante poder nas empresas) que têm valores mais elevados (com uma perda mediana de quase um milhão de dólares).
Já pensaram no que tudo isto representa sempre, mas muito particularmente nos períodos de dificuldades económicas como os que vivemos e se projectam no futuro? Quanto mais conhecermos e agirmos ꟷ em democracia ꟷ melhor estaremos em condições de debelar as fraudes, com mais Estado, mais fiscalização e, fundamentalmente, com mais ética vigente e mais especialistas em politica antifraude em todos os espaços de decisão.