Daniel Espínola, Jornal i

A corrupção requer o dispêndio de tempo e esforços significativos em negociações com os burocratas, contabilização dos pagamentos, contratação de intermediários e outras atividades que prejudicam o desenvolvimento econômico

Na esteira de uma preocupação internacional crescente e do estabelecimento de punições mais severas pelos países, muitas empresas envolvidas em atos de corrupção ainda se questionam se vale a pena continuar fomentando tais práticas. Todavia, principalmente em governos com instituições mais frágeis e setores econômicos mal regulados, a corrupção ainda parece ser a regra entre as companhias.
À primeira vista, o senso ético parece óbvio o bastante para afastarmos a ideia do pagamento de propinas a funcionários públicos, contudo não é raro ouvir no meio empresarial que a corrupção é muitas vezes uma prática inevitável - seria uma contribuição necessária para se "azeitar a máquina" governamental, uma “pedágio ou portagem" a se pagar para a empresa operar em alguns mercados, ou ter acesso a benefícios, como informações privilegiadas em relação a seus concorrentes, decisões favoráveis de funcionários e possibilidade de contratos mais vultuosos.

Está comprovado que a corrupção contribui drasticamente na redução da taxa de crescimento dos países e possui efeitos negativos sobre a distribuição de renda e riqueza. Ainda que as penalidades para as empresas envolvidas possam ser altas, o custo para elas pagarem propinas pode, inicialmente, parecer bastante atrativo, pois o pagamento constitui-se somente em uma pequena fração do benefício a ser auferido. As razões econômicas tornam-se ainda mais sedutoras quando a ação do funcionário pode causar um prejuízo potencial à firma, como a aplicação de multas ou a revogação de uma licença.
Por outro lado, muitas empresas que atuam desse modo esquecem de contabilizar os custos ocultos da corrupção - e que, frequentemente, são muito mais altos do que inicialmente imaginamos.
Primeiramente, empresas que possuem uma política de pagamento regular de propinas e outras práticas corruptas têm que manter em caixa uma considerável reserva de parte de seus capitais para tais pagamentos. As propinas não são sempre pagas em dinheiro "em espécie", mas também através de presentes, vantagens e favores diversos. Além disso, ao invés de as corporações se concentrarem no aumento da competitividade, fechamento de novos negócios ou desenvolvimento de tecnologias, a corrupção requer o dispêndio de tempo e esforços significativos em negociações com os burocratas, contabilização dos pagamentos, contratação de intermediários e outras atividades que prejudicam o desenvolvimento econômico.
Recentemente, no Brasil, ficou bastante conhecido o caso do Setor de Operações Estruturadas da empreiteira Odebrecht, denominado como a “Diretoria da Propina” - um departamento inteiro de uma das maiores empresas brasileiras dedicado profissionalmente a pagamentos sistemáticos de propina no Brasil e no exterior. Para se ter uma ideia da magnitude que pode alcançar as cifras, segundo a operação Lava-Jato, em apenas duas contas ligadas a esse setor paralelo da empresa, estima-se em torno de 20 milhões de dólares em pagamentos suspeitos.
As operações financeiras advindas da corrupção, naturalmente, nunca são contabilizadas oficialmente pelas companhias, ou são registradas de forma
mascarada, incorreta, o que impede ou dificulta sobremaneira os trabalhos de contadores e auditorias externas, gerando ainda mais custos para a contratação desses profissionais.
Ademais, algo a se considerar quando se analisam os custos disfarçados das práticas de corrupção são os seus “custos psicológicos”. Ainda que possuam uma natureza mais abstrata e subjetiva, as incertezas advindas da manutenção de um esquema corrupto podem ser significativas: insegurança até quando os atos ilegais serão mantidos e se serão realmente benéficos à empresa; o risco constante da descoberta do esquema corrupto pela polícia e órgãos de controle; assim como as suspeitas frequentes de que funcionários insatisfeitos possam no futuro denunciar tais práticas. Tudo isso gera temores e preocupações entre alguns empresários envolvidos, difíceis de se quantificar de forma pecuniária.
Engana-se também quem acha que um corrupto contenta-se com uma pequena e única vantagem. Geralmente, aquele que está imiscuído nesta prática raramente se dá por satisfeito e sempre espera mais de suas fontes. Em outros termos, é bastante comum que o corrupto insista em pagamentos subsequentes, e cada vez maiores, sob pena de prejudicar a firma em futuras negociatas ou dar preferências a outras concorrentes mais "generosas". As empresas acabam por se submeter a maiores extorsões e caem num buraco negro cada vez mais difícil de se escapar. Por um bom tempo ainda eram de pouca importância custos à imagem das companhias quando eram flagradas em esquemas de corrupção. Entretanto, na sociedade atual, onde informações circulam com muito mais rapidez, a imagem corporativa é um ativo imaterial cada vez mais valorizado. Uma simples suspeita de envolvimento em ilegalidade pode inviabilizar toda uma cadeia de negócios de uma companhia com seus parceiros, consumidores, futuros talentos e investidores, que evitam associar seus nomes a uma empresa possivelmente ímproba.
Além dos evidentes prejuízos às corporações, os custos ocultos da corrupção também atingem a sociedade como um todo, que paga por serviços e infraestruturas mais caros e de pior qualidade. Além dos custos financeiros, a corrupção também custa vidas, liberdade, saúde e educação de um povo. E com o tempo, ela gera cada vez mais desconfiança entre a população e seus representantes, corroendo aos poucos todo o pacto social.
Hoje a preocupação com a corrupção vai além das fronteiras nacionais. Além de iniciativas nacionais, a Organização das Nações Unidas (ONU), a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), a União Européia (UE) e a Organização dos Estados Americanos (OEA) são algumas entidades que têm trazido o tema do combate à corrupção com grande ênfase. Frente a esse esforço, as penalidades para firmas envolvidas em atos de corrupção têm sido cada vez mais frequentes. Contudo, um trabalho preventivo com as empresas, alertando-as para os custos ocultos da corrupção em seus negócios, certamente trará ainda mais retornos à sociedade e a criação de um ambiente econômico mais confiável, justo e transparente.

Auditor da Controladoria-Geral da União do Brasil (CGU) e membro do OBEGEF