Óscar Afonso, Dinheiro Vivo (JN / DN)
A consequência das nossas instituições extrativas tem sido a criação de uma sociedade regulada pelo demérito e pela desigualdade
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As sociedades são moldadas pelas suas instituições que determinam tanto os seus níveis de prosperidade como a forma de distribuição da prosperidade pela sociedade. Durante a maior parte da sua história, Portugal tem tido instituições políticas e económicas que têm sido extrativas no sentido em que as oportunidades políticas e económicas não têm sido abertas a todos, nem à maioria, porque o campo de jogo tem estado demasiado desnivelado a favor de uma elite. Por causa do carácter extrativo das instituições, Portugal não aproveita o talento dos seus cidadãos que, a menos que emigrem, não experimentam grande mobilidade social, apesar da universalidade do ensino.
A meu ver, as raízes das instituições políticas e económicas extrativas provêm do absolutismo português e têm permanecido no decurso do tempo. Nos descobrimentos, em Portugal, o comércio marítimo ficou sob controlo estatal e as riquezas do Novo Mundo solidificaram a monarquia, impedindo o pluralismo político, semeando o contexto que ainda permanece. Desde o absolutismo que o estado sabe que pode obter recursos facilmente, explorando – na altura os indígenas e o povo manso, agora apenas o povo manso! A política extrativa tem distribuído o poder político de forma desigual e tem permitido que o poder permaneça nas mãos de uma elite que controla o resto da sociedade.
Neste contexto, não faz mal, é até preferível, que o serviço nacional de saúde, o sistema nacional de educação, a segurança social e a justiça não funcionem. Para a saúde e a educação há a alternativa, desejável para o poder, que a iniciativa privada apresenta e que assim, em vez de competir, monopoliza a procura efetuada pelos cidadãos que interessam. Os cidadãos vencedores que ainda não foram destroçados pelo poder, que de algum modo acedem ao poder ou que podem comprar favores. As deficiências da segurança social apenas afetam os vencidos, aqueles que não acede ao poder político, que não controlam mercados, que não financiam campanhas eleitorais, que não compram favores e, portanto, não interessam e basta que vivam sobrevivendo. A inoperância da justiça, sugando-lhe continuamente recursos, interessa porque a corrupção e a regulamentação são fundamentais para alimentar a extração.
A consequência das nossas instituições extrativas tem sido a criação de uma sociedade regulada pelo demérito, pela desigualdade e tecnologicamente pouco dinâmica. Uma vez criadas, há uma tendência natural para a persistência de instituições extrativas que geram o seu próprio ciclo vicioso. De facto, a natureza extrativa das instituições auto-alimenta-se: o poder político amplamente concentrado, “com-primos e outros relativos”, leva a instituições económicas extrativas que não oferecem oportunidades, renda e riqueza de forma equitativa. Isto, por sua vez, ajuda a sustentar a concentração do poder político.
O potencial das mudanças estruturais recentes – revolução de abril de 1974, adesão à Comunidade Económica Europeia em 1986, e adesão ao Euro em 1999 – começou por minar a natureza extrativa das instituições. Porém, como sempre tem acontecido, foi sempre derrotado. É certo que as mudanças criaram novos desafios, mas estes foram sempre usados para criar barreiras à entrada e estreitar severamente a distribuição de poder; ou seja, as instituições continuaram a excluir pessoas de oportunidades económicas para que pudessem permanecer rendas de monopólio para os mesmos de sempre e também os mesmos políticos de sempre.
Por exemplo, no último caso – adesão ao euro –, a elite do setor financeiro atribuiu o capital estrangeiro à elite protegida dos setores de baixa produtividade, não transacionáveis, como o comércio grossista e retalhista. E assim, o benefício de uns durante o boom caiu sobre os excluídos, os pagadores, quando, em 2008, tudo se desmoronou. Mais uma vez, os frutos da labuta de muitos continuaram (e continuam) a servir para que poucos acumulem fortunas colossais, criando-se duas grandes classes: os tótós pagadores e a elite milionária.
Em desenho animado, podemos retratar a elite como um polvo, envolvendo-se paralelamente na economia e na política. Como, entre outros, o Paulo Morais bem tem “retratado”, o posicionamento dos tentáculos do polvo é tão significativo que manipula os sistemas político e económico em seu benefício, numa espécie de multiplicador das desigualdades.
Exige-se, portanto, uma série de reformas das instituições políticas destinadas a minar o objetivo dos partidos políticos do poder e a assegurar uma melhoria da democracia, que elimine a corrupção política e a "política da máquina" e, finalmente, tornem as instituições inclusivas.