Aurora Teixeira , Visão online

Os inúmeros e aparentemente infindáveis escândalos que envolvem os partidos incumbentes, abrangendo toda a latitude do espectro político, têm gerado uma insatisfação com a ‘elite’ política e, consequentemente, o surgimento de novos partidos populistas.

Considera-se usualmente que as Democracias morrem pelas armas, em golpes de estado e revoluções. Hoje em dia, contudo, é mais provável que sejam lentamente estranguladas em nome do povo.” (The Economist, 29.08.2019)

Um pouco por todo mundo, incluindo Portugal, tem emergido uma panóplia de “novos” partidos políticos, uma parte dos quais de natureza claramente ‘populista’.

O populismo corresponde a posições políticas que enfatizam a ideia do ‘povo’, um grupo ‘virtuoso’ e ‘moralmente bom’, contrapondo-o a uma ‘elite’ (política, mas não só) considerada corrupta e centrada na maximização do seu bem estar/ interesse. Os partidos populistas são frequentemente liderados por figuras carismáticas que se apresentam como a ‘voz do povo’, explorando cinicamente a insatisfação do cidadão comum .

Três fatores têm contribuido para a emergência desta ‘onda’ populista que está a minar os regimes democráticos: 1) a crise económica e financeira; 2) as circunstâncias económicas individuais, designadamente o desemprego e a precariedade do mercado de trabalho; 3) a percepção de uma corrupção crescente.

A mais recente crise económica e financeira convenceu grande parte dos eleitores de que estariam a ser governados por ‘elites’ desinteressadas, incompetentes e egoístas, mais preocupadas em ‘salvar’ os bancos e o sistema financeiro em geral do que preservar os empregos e o nível de vida do cidadão comum. Adicionalmente, diversos estudos (1) mostram que na Europa o desemprego tem sido uma razão fundamental da votação em partidos populistas de direita. Finalmente, o aumento da corrupção percecionada tem igualmente gerado uma perda de confiança na ‘elite’ política. No mais recente inquérito mundial da Ipsos MORI (2), os políticos surgem como o grupo profissional menos confiável do mundo. Os inúmeros e aparentemente infindáveis escândalos que envolvem os partidos incumbentes, abrangendo toda a latitude do espectro político, têm gerado uma insatisfação com a ‘elite’ política e, consequentemente, o surgimento de novos partidos populistas.

Os populistas aproveitam e cavalgam nesta onda crescente de ressentimento. Ainda que uma grande parte dos populistas façam parte do tal grupo de ‘ricos’ e ‘poderosos’, eles satirizam as ‘elites’ incumbentes de forma hipócrita/ cínica e, frequentemente, incoerente.

É da mais elementar honestidade intelectual reconhecer que nem todo o ‘povo’ é virtuoso e moralmente imaculado, assim como nem toda a ‘elite’ é corrupta e desinteressada. O grande problema do populismo é que as atitudes cínicas/ sarcásticas/ hipócritas corroem e desintegram as instituições democráticas que levaram décadas ou séculos e erigir.

Como afirmou Winston Churchill, “[n]inguém acredita que a democracia é perfeita ou onisciente. Na realidade, a democracia é a pior forma de governo, à exceção de todos os outros já experimentados ao longo da história.”

Notas:

(1) Ver Bosch, A. & Durán, I.M. (2019), “How does economic crisis impel emerging parties on the road to elections? The case of the Spanish Podemos and Ciudadanos”, Party Politics, 2019, Vol. 25(2), pp. 257–267.

(2) Ver https://www.ipsos.com/ipsos-mori/en-uk/ipsos-thinks-trust-truth.