Óscar Afonso, Dinheiro Vivo (JN / DN)
A medida da “globalização” é geralmente limitada à integração económica; no entanto, faria sentido considerar também a integração social e política
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Em Setembro de 2016, perante a estagnação no crescimento do volume de comércio mundial, o director-geral da Organização Mundial do Comércio (OMC) manifestava-se contra políticas proteccionistas por supostamente penalizarem o nível de comércio mundial e assim a criação de emprego, o crescimento e o desenvolvimento económico.
A globalização, usualmente referente à interligação das actividades económicas a uma escala global através de movimentos de bens, serviços, capital e pessoas, melhora a afectação dos recursos à escala mundial e difunde o conhecimento tecnológico. A corrupção, definida como toda a prática ou todo o comportamento desviante, é um fenómeno central na relação “globalização e desenvolvimento”. Este, como sabemos, é também um conceito vasto que envolve o crescimento económico e outros aspectos relacionados com o bem-estar de uma nação, como os níveis de educação e saúde.
Usualmente considera-se que a corrupção afecta negativamente o desenvolvimento económico, mas há também estudos que, pelo contrário, concluem que a corrupção pode estimular o desenvolvimento; por exemplo, facilitando transacções comerciais em condições de restrições regulatórias extremas. Também não é claro se a globalização reduz a corrupção, promovendo a transparência, ou se, inversamente, a globalização é um difusor de práticas corruptas.
Em termos da relação “globalização e desenvolvimento”, a posição dominante considera, na linha da OMC, que a globalização melhora o desenvolvimento. O argumento é que a globalização difunde os efeitos positivos da industrialização, do offshoring, do outsourcing e do Investimento Directo Estrangeiro (IDE). Nos últimos anos, porém, esse optimismo foi atenuado com a constatação de que o efeito da globalização depende da capacidade do país anfitrião para absorver as novas tecnologias, necessitando, por exemplo, de um stock mínimo de capital humano. Não admira que tenham surgido movimentos anti-globalização, considerando-a uma força empobrecedora dos países, que reflecte o neocolonialismo.
No que toca à relação entre “corrupção e desenvolvimento”, a posição dominante sustenta que a corrupção afecta negativamente a capacidade de desenvolvimento de um país, porque priva cidadãos comuns de bens e serviços vitais e impõe custos sociais severos. Pode prejudicar o crescimento económico, por dificultar a correcta afectação de recursos, e a quantidade e a qualidade do investimento. Assim se entende, por exemplo, que o Banco Mundial ou o Fundo Monetário Internacional sejam relutantes no apoio aos investimentos em países corruptos. Mas há também literatura a sustentar que a corrupção favorece o desenvolvimento; por exemplo, ao reduzir a burocracia pode favorecer o empreendedorismo e, assim, o investimento. Certo, no entanto, é que geralmente países com os menores níveis de riqueza económica per capita tendem a ser os mais corruptos.
Quanto à relação entre “globalização e corrupção”, a posição dominante sugere que a globalização reduz a corrupção porque traz a responsabilização instituída pelos parceiros comerciais internacionais. Assim se compreende que a corrupção seja menor nos países pertencentes a um maior número de instituições internacionais. Muitas instituições internacionais consideram a globalização como uma ferramenta poderosa no combate à corrupção, uma vez que pressupõe reformas estruturais e institucionais, como a liberalização dos mercados, o fortalecimento da concorrência, a transferência de tecnologia, a garantia de direitos de propriedade, o estado de direito, a transparência e o aumento qualidade dos serviços públicos que melhoram a atractividade do país em relação ao comércio e ao investimento. Essas reformas constituem o canal de transmissão através do qual a globalização afecta a corrupção. Mas há também literatura que sustenta que a globalização aumenta a corrupção, considerando que, pelo menos para países de baixo rendimento per capita, os fluxos de IDE recebidos estão associado à corrupção, hipoteticamente porque as rendas do IDE são de valor relativamente maior nesses países. A maior interacção internacional pode ser problemática na medida em que a corrupção é contagiosa, pelo que, face à globalização, os países de origem exportam práticas corruptas.
Refira-se ainda que há literatura a tratar da relação inversa entre “corrupção e globalização”. Neste caso, há quem considere a corrupção susceptível de prejudicar a globalização porque os efeitos negativos da corrupção na transparência e na pobreza desencorajam o IDE. Outros porém observam que a corrupção pode melhorar a globalização porque evita regulamentações pesadas e restrições administrativas.
Não há, portanto, consenso na literatura quanto às relações entre globalização, corrupção e desenvolvimento, porque há problemas de medida das variáveis e porque há uma série de canais contraditórios envolvidos. É o peso dos canais que determina o sentido de cada relação e não deixa de ser dependente dos conceitos avaliados. Por exemplo, a medida da “globalização” é geralmente limitada à integração económica; no entanto, ao relacionar a globalização com a corrupção faria também sentido considerar a integração social (p. ex., contactos entre pessoas ou fluxos de informações) e a integração política (p. ex., relações diplomáticas e internacionais).