Ana Clara Borrego, Jornal i
“A introdução a dedução à coleta no IRS (…) teve como principal objetivo o combate ao arrendamento não declarado, muito comum no meio estudantil”
Considerando a proximidade do início do ano letivo, bem como a falta de informação (e desinformação) que, ainda, existe em torno da dedução à coleta no IRS das despesas com o arrendamento de imóveis para estudantes deslocados, bem como à pertinência do tema para muitas famílias, resolvi eleger este assunto para tema desta crónica.
Antes de mais, é importante referir que, para este efeito, se considera “estudante deslocado”, aquele que, cumulativamente, cumpra os seguintes requisitos: não tenha mais de 25 anos, frequente estabelecimento de ensino integrado no sistema nacional de educação ou reconhecido como tendo fins idênticos, que se situe a uma distância superior a 50 kms daquela que é a residência oficial do seu agregado familiar.
Neste ponto, importa esclarecer que:
Não obstante os estudantes deslocados serem, maioritariamente, alunos do ensino superior, este regime é aplicável a estudantes de outros graus de ensino;
Apesar deste enquadramento se aplicar, sobretudo, a jovens dependentes dos pais, padrastos ou tutores legais, isto é, que surgem no agregado familiar sob a figura fiscal de “dependentes” (principalmente devido ao limite de idade), na realidade, embora sejam situações menos usuais, este enquadramento, também, é aplicável a jovens estudantes que já ganharam autonomia e que entregam o seu IRS enquanto sujeitos passivos;
O regime é aplicável a estudantes do ensino privado, desde de que o estabelecimento de ensino esteja reconhecido pelo ministério competente;
O estudante deslocado deve manter a sua morada oficial (do cartão do cidadão) não a alterando para a “nova” morada.
Importa referir que, a partir do ano 2018, havendo despesas comprovadamente suportadas por aqueles estudantes correspondentes ao arrendamento de imóveis ou partes de imóveis para fins do seu alojamento, passou a dar origem a uma dedução à coleta de IRS integrada no âmbito das despesas de educação e formação.
Para se compreender melhor o impacto fiscal no IRS das famílias das despesas com arrendamento dos estudantes deslocados é necessário compreender que, em termos gerais, cada agregado familiar pode deduzir no IRS 30% dos gastos que comprovadamente tenha suportado durante o ano civil com as despesas de formação e educação, com possibilidade de vir a deduzir no IRS até € 800 anuais, todavia, caso existam no agregado estudantes deslocados nas condições referidas, aquele limite máximo aumenta para € 1.000 anuais, não podendo a dedução correspondente a 30% do valor da rendas exceder € 300 anuais.
Neste ponto, importa realçar que:
Esta dedução à coleta aplica-se tanto a despesas com arrendamento, como com subarrendamento (assim, sempre que, ao longo da crónica me referir ao arrendamento o leitor deve considerar que o mesmo é aplicável, também, ao subarrendamento);
Este regime é aplicável quer ao arrendamento de um imóvel, quer a parte de um imóvel - é, assim, aplicável, por exemplo, ao arrendamento de quartos;
O valor a deduzir ao IRS com a renda são 30% do valor comprovadamente despendido com aquele encargo e não o valor efetivamente gasto;
Para deduzir o valor máximo de € 300 anuais, é necessário que, cumulativamente: os encargos anuais comprovadamente suportados com rendas totalizem valor maior ou igual a € 1.000 (1.000 x 30% = 300) e não ter resultado dos restantes encargos com educação e formação dedução superior a € 700 anuais.
Note-se que, para que as despesas com as rendas de estudante deslocado sejam dedutíveis ao IRS do agregado familiar é essencial existir um contrato de arrendamento/subarrendamento do imóvel ou de parte dele, no qual outorga como inquilino o estudante. É, ainda, imprescindível que o senhorio registe o contrato no Portal das Finanças e o inquilino (estudante) registe o seu enquadramento especial de estudante deslocado, para tal é necessária a intervenção de ambos, senhorio e estudante (por esta ordem):
Primeiro, o senhorio regista, no «Portal das Finanças è e-arrendamento», o contrato de arrendamento/subarrendamento de imóvel ou parte de imóvel;
Segundo, depois do contrato ter sido registado pelo senhorio, o estudante deve aceder à sua área no «Portal das Finanças è e-arrendamento» e no menu da esquerda escolher a opção «Registar Estudante Deslocado», seguidamente, selecionar o contrato a afetar ao estudante deslocado e escolher, de seguida, a opção «registar»;
Os recibos de arrendamento emitidos pelo senhorio passarão a conter a seguinte indicação: "O arrendamento/subarrendamento destina-se a estudante deslocado", a qual é imprescindível para ser possível usufruir da dedução para efeitos de IRS.
Para finalizar, não poderia deixar de terminar com uma breve nota crítica em relação à forma como esta dedução à coleta foi “desenhada”.
Em primeiro lugar, não posso deixar de realçar que esta dedução se aplica por agregado familiar e não por estudante deslocado, isto é, o valor máximo dedutível matem-se em € 300 anuais, independentemente do número de estudantes deslocados num agregado familiar, o que, em muitos casos, torna o valor deduzido no IRS ridiculamente reduzido comparativamente com o valor efetivamente despendido pelo agregado familiar com o alojamento dos estudantes.
Em segundo lugar, para a maioria dos alunos deslocados as despesas com o alojamento representam a maior fatia dos seus gastos com educação e formação dedutíveis em IRS, consequentemente não faz sentido que a dedução no IRS tenha sido concebida de forma inversa, isto é a prever um menor valor dedutível para as despesas com alojamento do que com os restantes encargos de formação e educação. Ora vejamos, o valor máximo de dedução possível de atingir no IRS com despesas e educação e formação são € 1.000 anuais, que se repartem da seguinte forma: € 300 anuais para a dedução respeitante aos encargos com alojamento e € 700 anuais para a dedução à coleta referente aos restantes encargos, nomeadamente propinas (Recordo que para o próximo ano letivo o valor máximo das propinas do ensino superior público descerá para 871,52€ para os CTESP, Licenciaturas e Mestrados Integrados), livros e restantes encargos dedutíveis em IRS.
Por último, referir que a introdução desta dedução à coleta no IRS, na minha opinião, teve como principal objetivo o combate ao arrendamento não declarado, muito comum no meio estudantil; é, todavia, no meu ponto de vista, fraca medida, pois pelo seu reduzido impacto no IRS das famílias versus os valores despendidos anualmente pelos agregados familiares em rendas para o alojamento dos estudantes deslocados, pode propiciar, assim, a continuidade do conluio entre inquilino e senhorio na não declaração dos contratos de arrendamento.