Raquel Brito, Jornal i

Atualmente não existe prevenção da criminalidade económica e financeira em território nacional. Assistimos a intervenções a posteriori e à sensação de impunidade.

Nas comunidades contemporâneas assiste-se a um crescendo de divulgação, e algumas condenações, de casos relacionados com a criminalidade económica e financeira, quer privada quer pública. Casos de corrupção, conflitos de interesse, abuso de poder,….e a lista continuaria.

No entanto, não nos é possível afirmar, em consciência, que o fenómeno se encontre em crescimento! Esta ausência de conhecimentos mais concretos, sobre atos praticados neste âmbito, pode ser justificada pela inexistência de estudos quantitativos anteriores.

É um vasto campo de investigação, com inúmeras variáveis e interdependências, nomeadamente a variação da quantidade de atos, a sua diversidade ao longo do tempo, ou das relações intrínsecas ao fenómeno.

Estudos longitudinais, bem desenhados, poderiam possibilitar comparações entre períodos de tempo consideráveis. Este tipo de análise obriga a estudos científicos regulares que produzam dados que possam (ou não) ratificar determinadas conclusões. Ajudando a um conhecimento mais realista desta tipologia de ilícito.

Na realidade, é possível estarmos a ser só, simplesmente, contemplados com um aumento (diria que exponencial) da divulgação pública de casos associados a esta criminalidade. Sendo que, em muitos dos casos, o seu tempus delicti é muito anterior ao seu “tempo mediático”.

Na criminologia, como em qualquer investigação científica, procura-se separar o conhecimento científico do conhecimento do senso comum. Conducente com o estudo de qualquer tipologia criminal. Vejamos, por exemplo, a violência doméstica.

Temos assistido a um flagelo de vítimas relacionadas com este tipo de crime. No entanto, é possível reconhecer que este não será um fenómeno recente, apenas se limitou a deixar de estar circunscrito às 4 paredes dos seus intervenientes.

Em suma, muito provavelmente não aumentaram os crimes de violência doméstica, mas sim a divulgação de um crime que passou a assumir uma natureza pública (mediática e legal).

Com as devidas diferenças, obviamente, mas poderia ser feita uma analogia entre estes dois tipos de crime. Quanto ao aumento do número de casos divulgados e quanto ao enorme fracasso que tem sido o combate aos mesmos. Assim como quanto às metodologias de prevenção que lhes são associadas…?

Ora, centrando a questão no tema da corrupção, e pressupondo uma abordagem holística, faria sentido investir seriamente na prevenção. A análise científica elaborada pela criminologia a programas de prevenção nas mais diversas áreas do crime, deveria ser levada em consideração no estudo científico da corrupção.

O estudo de programas de prevenção da criminalidade, com diferentes eficácias (tais como Scared Straight, cognitivo-comportamentais), justifica, claramente, a importância da prevenção. É fundamental perceber “what works?”. E tal só será possível se houver matéria de análise.

Atualmente não existe prevenção da criminalidade económica e financeira em território nacional. Assistimos a intervenções a posteriori e à sensação de impunidade.

Em virtude do cenário público a que temos assistido será urgente dedicar algum tempo a esta celeuma e tentar perceber o que há a fazer, de forma estruturada, metodológica que revele alguma eficácia, mesmo que só a longo prazo.

A ser verdade que esta é uma questão cultural, tenhamos consciência que serão necessárias décadas para alterar comportamentos.