Nuno Gonçalves, Visão online

Quando está em causa o rendimento para subsistência em situação de informalidade, a igualdade de género assume uma dimensão ainda mais importante, uma vez que as mulheres tendem a estar em situações mais vulneráveis. A almofada social, a existir, tem de ser igualitária.

O trabalho informal em Portugal é de 12,1% do emprego total na economia, segundo o último relatório da ILO, de 2018, com a participação dos homens na informalidade a ascender a 13,5% e a das mulheres a 10,7% do emprego total. Segundo esse relatório, este padrão verifica-se a nível mundial, sendo a informalidade mais frequente nos homens (63,0%) do que nas mulheres (58,1%). Dos 2 mil milhões de trabalhadores que se estima que tenham um vínculo de trabalho informal por todo mundo, mais de 740 milhões são mulheres.

A falta de acesso e de cobertura pela proteção social e pelos direitos laborais, as condições de trabalho precárias e muitas vezes em ambiente perigoso e a baixa remuneração e produtividade caracterizam o trabalho informal. A informalidade laboral assume várias formas: trabalho remunerado doméstico e em estabelecimentos informais, trabalho por conta própria, trabalho familiar auxiliar não pago, ou trabalho informal remunerado em estabelecimentos formais.

Para Portugal, a ILO estima que 22,1% das mulheres com emprego informal sejam trabalhadoras por conta de outrem, 14,8% empregadoras, 58,1% trabalham por conta própria e 5,0% detenham um trabalho familiar auxiliar não pago. Nos homens, 9,0% são trabalhadores por conta de outrem, 20,8% são empregadores, 66,7% trabalham por conta própria e 3,6% detêm um trabalho familiar auxiliar não pago. Portugal está na média das economias desenvolvidas ao ter uma percentagem mais reduzida de trabalhadores por conta de outrem no emprego informal, apesar da diferença ser menor nas mulheres.

O estudo demonstra também que, entre os trabalhadores menos qualificados, as mulheres apresentam maior participação na informalidade face aos homens, sendo este padrão invertido para mulheres e homens com um nível de educação secundário ou superior. O menor nível de qualificação em conjunto com a forma de trabalho informal assumida indicam que as questões de desigualdade de género que se verificam no mercado de trabalho refletem-se também no trabalho informal, com as mulheres a estarem mais vulneráveis e sujeitas a precariedade em comparação com os homens em informalidade. Um exemplo é o do cuidador informal, na sua maioria efetuado sob a forma de trabalho familiar auxiliar não pago.  Segundo o projeto de lei n.º 801/XIII, “o cuidador informal típico é mulher, é familiar da pessoa cuidada e tem entre os 45 e os 75 anos, muito embora haja uma grande diversidade de situações.” Este projeto de lei é uma medida que pretende complementar o Estado Social no reforço aos Cuidados Continuados Integrados, mas foca-se numa pequena dimensão do trabalho informal. Segundo a ILO (2018), o trabalho familiar auxiliar não pago representa em Portugal 4,2% do total de trabalho informal estimado.

Muitas das medidas que podem mitigar as diferenças de género no mercado de trabalho são permeáveis à informalidade, abordando crenças socioeconómicas enraizadas na sociedade que criam barreiras à igualdade de oportunidades entre géneros. Em Portugal, é notória a proeminência do estatuto de “empreendedor” (trabalhador por conta própria ou empregador) nos homens com trabalho informal em Portugal, representando 87,5% do total de trabalhadores do sexo masculino em informalidade. Este número contrasta com os 72,9% no caso das mulheres, pois estas não só detêm mais vínculos de trabalhador informal por conta de outrem como apresentam um rácio mais elevado de trabalho familiar auxiliar não pago. Apesar da tendência ascendente por todo o mundo das mulheres empreendedoras no trabalho informal, estudos indicam que estas ainda encontram barreiras ligadas ao género em termos de acesso ao crédito, a tecnologia, a serviços, a formação e acesso ao mercado.

A economia informal é tolerada pelos governos pela consciência que serve de almofada social principalmente em tempos de crise económica. Esse papel reforça a importância das questões de igualdade de género no trabalho, seja formal ou informal. Quando está em causa o rendimento para subsistência em situação de informalidade, a igualdade de género assume uma dimensão ainda mais importante, uma vez que as mulheres tendem a estar em situações mais vulneráveis. A almofada social, a existir, tem de ser igualitária.

Referências:

ILO (2018). Women and men in the informal economy: A statistical picture (third edition). International Labour Office – Geneva.

Otobe, N. (2017). “Gender and the informal economy: Key challenges and policy response.” ILO Employment Policy Department, Employment Working Paper No. 236.