José António Moreira, Visão online

“Ao fim de quatro anos, um país no seu conjunto, esqueceu-se dos maus momentos que viveu em termos económicos”

...

  1. “Insanidade”. Para os estudiosos da mente, a preservação da sanidade desta passa, em parte, por se ser capaz de esquecer os acontecimentos traumáticos que aconteceram no passado. Por exemplo, as memórias da infância que a generalidade das pessoas conserva é relativa a “dias de sol”, a memórias boas.
  2. “Esquecer”. Ao fim de quatro anos, um país no seu conjunto, esqueceu-se dos maus momentos que viveu em termos económicos – famílias esmagadas por dívidas bancárias; bancos resgatados à beira da falência, incapazes de cobrarem o crédito concedido. Persevera nos mesmos erros que levaram a tais momentos traumáticos. Não é um quadro favorável da sanidade mental coletiva.
  3. “Estatística”. No ano, até julho, em termos homólogos, o crédito à habitação aumentou 26%; o crédito pessoal, 8,7%; o crédito automóvel, 17,3%.
  4. “Culpa”. Repartida, por todos. Famílias, atuando como se o dia de amanhã não existisse; Governo, apostando no consumo como motor de crescimento, mesmo que financiado com dívida; sistema bancário, sobredimensionado, preferindo “apostar” no crédito à habitação, com margens de 1% ou até menos, do que no financiamento das empresas; Banco de Portugal, tentando condicionar os bancos nesta corrida para um novo trauma, muito timidamente.
  5. “Resolução”. Bancos. Mudou, relativamente à última crise. Os depositantes serão chamados a participar no salvamento de bancos em risco de falência, desde que tenham depósitos em montante superior a 100.000 euros. Poupam-se os contribuintes, os pagadores de impostos.
  6. “Crise”. Voltará, falta saber quando. É uma questão de tempo, são os ciclos económicos. Esta certeza não parece tirar o sono a ninguém. Como na fábula de LaFontaine, com a cigarra e a formiga, memória traumática para a primeira, que a mente varreu para as profundezas do esquecimento. Ela, crise, voltará, e vai apanhar as cigarras a cantar, alegres, vivendo o dia presente, porque amanhã é outro dia. Baterá com força. Os culpados apresentar-se-ão como vítimas.
  7. “Racionalidade”. Os banqueiros, que colhem bónus salariais por negócios feitos sem garantia de recuperação; os acionistas, cujas ações sobem, até ao dia em que desabarão, com estrondo, em cima de outros; os governantes, que colhem votos e sinecuras porque a economia progride, mesmo que o vapor que a movimenta não seja sustentável no tempo; os depositantes, que retirem o seu dinheiro dos bancos que mais apostam na concessão de crédito à habitação e pessoal.
  8. “Irracionalidade”. Famílias.