Jorge Fonseca de Almeida, Jornal de Negócios

Os dinamarqueses, à semelhança de outros países nórdicos, gostam de se gabar da sua alegada seriedade que contrasta com a corrupção que grassa nos países do Sul.

Esta é frequentemente uma estratégia para intimidar e desanimar os países do Sul, nomeadamente quando se discute a dívida externa ou outros interesses económicos. A verdade, porém, é muito diversa.

Recentemente rebentou o escândalo da lavagem de dinheiro de um dos principais bancos nórdicos, o maior banco da Dinamarca, o Danske Bank. Dada a posição do Danske no sistema financeiro nórdico é o sistema na sua totalidade que se encontra em causa.

Os envolvidos são da ordem das dezenas de milhares de milhões de euros e terão entrado pela sucursal da Estónia e depois seguido um intrincado caminho de transferências internas entre contas de empresas de fachada sediadas noutras sucursais do Danske localizadas em vários países incluindo a Lituânia, a Ucrânia e a Letónia. No final destas transferências o dinheiro desviado ressurgia "limpo" e legal nas mãos dos criminosos iniciais, como se de proventos legais e lícitos se tratassem.

Esta é, pelos gigantescos valores envolvidos, a maior operação de lavagem de dinheiro conhecida até hoje.

As cotações do Danske Bank estão naturalmente em queda, à medida que o mercado se vai consciencializando das suas estranhas práticas e que as ações vão entrando nos tribunais dinamarqueses e de outros países, nomeadamente em França. Espera-se igualmente que as autoridades norte-americanas multem o Danske em várias dezenas de milhões de dólares apesar de estas operações não terem, pelo pouco que se sabe ainda, passado pelos Estados Unidos.

Em resposta ao escândalo a suavidade das autoridades reguladoras dinamarquesas, que se limitou a repreender o Danske Bank e a apelar para que aperte os controlos internos contra a lavagem de dinheiro, é vista como mais um sinal de que é o sistema financeiro como um todo que está em causa. Nenhum responsável do banco foi sancionado pelas autoridades locais.

As semelhanças com outras realidades são notórias: inquéritos internos inconclusivos, autoridades reguladoras que nada suspeitam nem descobrem e que depois não punem, justiça que não funciona, responsáveis máximos intocáveis, oposição política muito vocal, mas incapaz de alterar o que quer que seja.

Muitas lições podemos retirar deste caso, uma das quais é que já aprendemos com estes países tudo o que precisámos sobre combate à corrupção. Eis, pois, uma área em que temos tido bons alunos. Sucessivos governos têm estabelecido a meta de aproximar o país da média europeia. Em matéria de combate à corrupção vários dos nossos banqueiros e reguladores estão, seguramente, a par com o melhor que acontece na Dinamarca.

No final do século XVI o dramaturgo inglês escreveu na sua aclamada peça Hamlet "Algo está podre no Reino da Dinamarca". Passados mais de 400 anos a frase mantém toda a sua atualidade.