António João Maia, Jornal i

Os elementos mais novos nas organizações – e nas sociedades – parecem estar mais predispostos a aceitar com “normalidade” as práticas de fraude e corrupção nos negócios.

estudo “Integrity in the spotlight” recentemente publicado pela Ernst & Young acerca da Integridade na vida das pessoas e das organizações revela dados muito interessantes e pertinentes sobre o modo como a fraude e a corrupção são percebidas e assumidas pelas pessoas no contexto da ação das organizações.

Alguns resultados deste estudo, que resultou de um questionário realizado a mais de 2500 executivos das maiores companhias de 55 países de todo o mundo, incluindo Portugal, são merecedores de uma reflexão atenta e cuidada.

Um primeiro resultado a destacar, associado às expectativas sobre a ação das organizações, prende-se com o facto de praticamente todos os respondentes (97%) assumirem a necessidade de essa ação se fazer segundo critérios de Integridade. Deste ponto de vista das expectativas da ação, cremos que os resultados não poderiam ser melhores, na medida em que as pessoas assumem que a Integridade é um elemento central no contexto em que as organizações desenvolvem a sua ação.

Porém, quando se olha para os resultados associados à ação concreta que é assumidamente realizada pelas mesmas organizações, verificamos que o sentido das respostas revela uma realidade algo afastada daquela expectativa.

De facto, 11% dos inquiridos assumem que as suas companhias foram objeto de fraude nos últimos 2 anos. Por outro lado, um rácio semelhante de respondentes (11%) assume ser comum a ocorrência de práticas de suborno no âmbito de contratos realizados no setor onde as suas organizações operam. E, o que parece ser um sinal pior, 13% dos inquiridos justificam mesmo a existência de subornos como modo de concretizar os negócios e manter a sobrevivência económica das suas organizações. Estes resultados não nos dizem se as pessoas concordam com estas opções, mas revelam pelo menos que a sua existência é assumida como uma espécie de “regra do jogo”.

Um último dado revelado pelo estudo, relativamente às ações realizadas pelas organizações, mostra que para 38% dos entrevistados os negócios realizados nos seus países incluem práticas de suborno.

Mas o resultado que em nosso entender se afigura mais curioso – e porventura mais preocupante – deste estudo é o que se prende com a aceitação, como uma espécie de normalidade, das situações de suborno associadas à ação das entidades. E os sinais de preocupação derivam do facto de este (alegado) sentimento de normalidade relativamente às situações de suborno apresentar uma expressão maior entre os respondentes mais novos. Os resultados concretos revelam que 1 em cada 8 respondentes com 35 ou mais anos de idade considera justificável ou aceitável a existência de situações de suborno. Mas quando olhamos para as respostas dos indivíduos com idade inferir a 35 anos, os resultados mostram que o rácio de aceitação é de 1 em cada 5 dos respondentes. Por outras palavras, estes resultados suscitam a hipótese de os elementos mais novos nas organizações – e nas sociedades – estarem mais predispostos a aceitar com “normalidade” as práticas de fraude e corrupção nos negócios.

A ser razoável esta hipótese, ela significará desde logo, que alguma coisa esteja a alterar-se no processo de educação das novas gerações. A educação em torno dos valores da Ética, da Cidadania e da Integridade carece de ajustes e de reforço, quer em termos do papel e da função da família enquanto elemento central na transmissão dos valores culturais e sociais, quer em termos da ação das instituições do sistema formal de ensino, designadamente da escola e da universidade. Ou, hipótese alternativa – que os mais renitentes, entre os quais me incluo, não conseguem ou se recusam a ver –, a realidade está mesmo em mutação profunda e o quadro dos ditos valores coletivos está a dar lugar a um quadro de valores mais individuais e egocêntricos.

Enfim o futuro, que depende das nossa vontade e interesse coletivo, mostrará que caminho seremos capazes de trilhar.

É pena que este estudo não mostre os resultados por países, para verificarmos, por um lado, se estas tendências são uniformes, e, por outro lado, que resultados se registaram relativamente a Portugal.

Uma leitura final que estes resultados nos suscitam é a de que as boas ações – sejam elas quais forem – devem realizar-se simplesmente porque sejam sentidas e postas em prática enquanto tal, e não apenas porque decorrem de um qualquer processo impositivo.

É que a Ética, a Cidadania e a Integridade resultam melhor se decorrerem de processos de adesão natural dos sujeitos.