Jorge Fonseca de Almeida, Negócios
A onda de distribuição exagerada de dividendos significa que as empresas não pretendem investir no país, que sentem que não têm capacidade de competir, que sabem que os respetivos mercados estão em declínio, que pressentem que Portugal não tem um futuro risonho pela frente.
O Jornal de Negócios chamou, num interessante artigo de Nuno Carregueiro, a atenção para a distribuição de dividendos que as grandes empresas representadas no PSI-20 têm vindo a aprovar neste ano de 2018.
De acordo com o artigo citado, mais de 70% dos dividendos destas empresas serão distribuídos aos acionistas sendo que, em dois casos, serão mesmo pagos dividendos superiores aos lucros obtidos.
Quando as empresas têm oportunidades de negócios que pensam ser capazes de alcançar, quando os mercados crescem, o normal e natural é reinvestirem os lucros canalizando-os para a expansão da atividade.
Inversamente quando os acionistas sentem que o mercado não cresce ou que não possuem "o engenho e a arte" para competir ou ainda não têm interesse em apostar no país, procuram retirar o seu investimento o mais rapidamente possível, quer através da distribuição de grandes fatias dos lucros quer da venda do capital da empresa. Naturalmente, em empresas muito lucrativas a venda do capital pode ser contraproducente pelo que o caminho da distribuição de dividendos se afigura mais apetecível.
Esta é, pois, uma má notícia para o país. A onda de distribuição exagerada de dividendos significa que as empresas não pretendem investir no país, que sentem que não têm capacidade de competir, que sabem que os respetivos mercados estão em declínio, que pressentem que Portugal não tem um futuro risonho pela frente.
O volume de dividendos distribuídos ascende a mais de 2,3 mil milhões de euros, uma quantia superior à que Portugal investe na defesa nacional.
Olhando para a composição acionista das empresas do PSI-20 vemos que uma grande fatia do capital pertence a entidades estrangeiras e que são essas que vão receber uma percentagem muito importante desses dividendos, ou seja, os lucros que essas empresas têm em Portugal vão servir para o investimento no estrangeiro.
Eis o resultado das privatizações e da liberalidade com que se aceitam as aquisições de posições acionistas relevantes em empresas portuguesas por investidores internacionais. Essas empresas transformaram-se em meras sucursais de multinacionais estrangeiras interessadas em receber dividendos que canalizam para a sua expansão noutras paragens.
O futuro destas empresas limita-se agora, em muitos casos, ao mercado nacional e mesmo assim com restrições porque muitos serviços tendem a ser centralizados na casa-mãe, local onde tende igualmente a localizar-se a investigação, o desenvolvimento e a criação de novos produtos/serviços.
Ficámos com um tecido empresarial empobrecido em que as grandes empresas perdem a sua função de tração da economia nacional, de centros de inovação e de embriões de possíveis multinacionais portuguesas para se transformarem em meros sugadores de recursos rapidamente canalizados para os acionistas estrangeiros.
Uma grave perda de autonomia estratégica nacional no domínio económico que deve ser encarada como potencial ameaça à perenidade do nosso país.
Economista