Carlos Pimenta, Jornal i online

Se viajar de Lisboa a Moscovo, o conta-quilómetros indicará 4.563 Km. Não chega para imaginar a riqueza nos offshores, expresso em notas de cem dólares. Para tal precisa de apanhar em Lisboa um avião para Nova Iorque.

1. Em 16/02/13 a capa de The Economist referia-se ao estudo de James Henry, ex-director de investigações económicas da McKinsey& Co., que, conjugando análises estatísticas e entrevistas (com banqueiros, advogados e criminosos) concluiu que a riqueza «perdida» em 2010 nos territórios offshore era entre US$ 21 e US$ 32 «triliões».

Porque as tentativas de uniformização intercultural da designação dos grandes números nunca foram aplicadas, um trilião anglo-saxónico (milhar de bilião, que por sua vez é um milhar de milhão) é, na terminologia portuguesa, bilião (um milhão de milhão). Se considerarmos o valor intermédio podemos ser categóricos: a riqueza acumulada nos offshores é de 26,5 biliões de dólares dos EUA. Para não haver confusão estamos a falar de 26.500.000.000.000 (=26,5x1012).

Estamos um pouco mais esclarecidos, mas o sociólogo Giddens tem razão quando diz que para a maioria das pessoas um milhão já nada significa tendo em conta a sua vivência e, por isso estabelece uma imagem de referência, rigorosamente medida: “medido em montes de notas de 100 dólares, atinge a altura de vinte centímetros”. Então 1 bilião corresponde a 20.000.000 centímetros, isto é, a 200.000 metros, ou a 200 quilómetros. Enfim o montante de riqueza nos offshores é de 5.300 km. Se for de Lisboa a Moscovo de carro, o conta-quilómetros indicará 4.563 km. Não chega para imaginar a riqueza nos offshores, expresso em notas de cem dólares. Para tal precisa de apanhar em Lisboa um avião para Nova Iorque.

2. Há uma panóplia de razões para esses valores estarem registados nesses paraísos fiscais e burocráticos, nessas jurisdições de sigilo: do negócio legítimo à fraude fiscal; da especulação bolsista ao encobrimento da riqueza por motivo de um divórcio, da lavagem de dinheiro da droga a muitíssimos outros motivos desse branqueamento de capitais (da corrupção ao tráfico de órgãos humanos), de razões ligadas a uma herança à sugestão de um gestor de fortunas, auditora ou advogado. Enfim os motivos são muitos mas é inequívoco que a grande maioria desses valores estão associados à fuga ao fisco e ao branqueamento de capitais da corrupção e do crime organizado transnacional.

Os offshores são uma via legal para os poderosos das finanças e da riqueza mundial (crescentemente desigual) fazer com que sejamos nós a pagar as suas fraudes e a degradar as nossas condições de vida. São esses e outros assuntos correlacionados que procuramos abordar no livro Os offshores do nosso quotidiano, recentemente editado pela editora Almedina.