Carlos Pimenta, Jornal i online

Em 2011 os activos financeiros globais nos offshores foram estimados entre 21 e 32 biliões de dólares, vagabundeando principalmente por defraudadores, corruptos, e elites criminosas.

1. Numa cruzada pelo direito à informação e por uma vida mais digna dos cidadãos de todo o mundo o Consórcio Internacional dos Jornalistas de Investigação (ICIJ)  continua a divulgar documentos que aclaram algumas facetas das jurisdições de sigilo, habitualmente designadas por offshores. Sigilo dos negócios escondidos, da corrupção, da lavagem de dinheiro e da fuga aos impostos, de muitas elites sociais e do crime organizado.

Depois dos dados sobre offshores em 2013, do escândalo dos acordos secretos no Luxemburgo no ano seguinte, dos famosos Papeis do Panamá em 2016 e da divulgação de mais alguns dados pontuais, este ano chegaram os «Papeis do Paraíso» (Paradise Papers), baseados em 13,4 milhões de documentos electrónicos confidenciais, relatando investimentos em offshores, que foram entregues a um jornal diário alemão. Os documentos são originários de um escritório de advocacia offshore, de empresas de apoio e registo offshore em 19 paraísos fiscais. Os dados contêm os nomes de mais de 120 mil pessoas e empresas.

2. A ICIJ também tem tido a preocupação em organizar as informações tornando-aos acessíveis a qualquer um de nós (https://offshoreleaks.icij.org/) e a investigadores especializados.
A forma de chamar a atenção do público e dos Estados, é revelar uma vasta lista (que existe sempre) de personalidades públicas dos diversos países, ou seus familiares, que constam da documentação analisada. O escândalo promove a argúcia e a sensibilidade pública. Contudo o fundamental a reter é que toda a sua vida (isso mesmo, a sua!), provavelmente em vários aspectos mais dramáticos, estão estreitamente associados à existências desses édenes (de quem?), regiões caracterizadas por serem partes integrantes de uma rede de paraísos fiscais, de jurisdições de sigilo e de total desburocratização e ausência de fiscalização, onde a circulação de capitais sem quaisquer entraves assume a plenitude.

Numa sociedade mundial em que 1% dos mais ricos possuem mais riqueza que os 99% restantes, são poucos os maliciosos que usufruem desses territórios e muitos os que sofrem as suas consequências.

3. Os serviços públicos que não tem e os pesados impostos que paga; os preços de muitos bens que lhe são vitais e o baixo salário mínimo que existe e influencia no mesmo sentido todos os restantes; o desemprego em que está ou que o ameaça e o baixo crescimento económico comparado com outras épocas; a elevada quantidade de economia ilegal e a insegurança que o banditismo e o terrorismo representam; a abdicação de riquezas estratégicas da nossa sociedade e a proliferação actual da escravatura; a privatização dos lucros de empresas e a nacionalização dos custos das fraudes alheias; a corrupção sistemática a que se assiste e a lascívia social perante tais situações; o seu amor à democracia e a sua subordinação às chamadas «leis do mercado»; tudo isso, e muito mais, está associado aos offshores.

A sua existência não é só um problema dos Estados (alguns com grandes responsabilidades na sua criação, desregulação e descriminalização,com a complacência de muitos).

É um problema de todos nós!

Como diz Shaxson: “Os paraísos fiscais actuam em todos os lugares, logo, no seu país, na sua cidade. Enfraquecem os governos eleitos, minam a base tributária dos Estados e corrompem a vida política. Apoiam uma vasta economia criminal e permitiram o surgimento de uma nova aristocracia das finanças e dos negócios que não prestam contas a ninguém. Se não unirmos as nossas forças para limitar e controlar o segredo financeiro, o mundo que vi na África Ocidental há uma década tornar-se-á o mundo que legamos aos nossos filhos: nepotismo, impunidade, delinquência transfronteiriça e pobreza extrema. Alguns felizes limparão as suas botas no champanhe, enquanto o resto da sociedade esforçar-se-á para sobreviver. Podemos garantir que esse futuro não aconteça.”