Raquel Brito, Visão online,

A fraude académica é a antecâmara do cometimento de fraudes ao longo da sua futura actividade profissional? Talvez sim, mas não imperativamente. Talvez não, mas pode ensinar.

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O estudo da fraude académica tem adquirido cada vez mais notoriedade, bem como maior interesse por parte de investigadores de distintas áreas. As variáveis que contribuem para o estudo deste fenómeno são inúmeras, tais como o ano escolar, a regularidade com que se pratica esta “técnica”, o género de quem a pratica, a idade dos estudantes…

Não subsistem dúvidas que este fenómeno é intemporal e presente nas instituições de ensino, independentemente do ano escolar/académico em que os alunos se encontram, enquadrando comportamentos que vão desde o ato de copiar (e.g. pelo colega, por equipamentos tecnológicos), até ao plágio, passando pela marcação de falsas presenças. São vastos os fatores que levam à existência deste fenómeno, nomeadamente a pressão para não falhar, a educação dos pais, a forma como os estudantes percecionam o ato em si, a postura o professor, a instituição de ensino…

Para esta análise são considerados dois tempos: 1- durante o ensino superior e, 2- durante o 3º ciclo e ensino secundário; e um só pressuposto: há quem não pratique fraude académica.

1.Encontrados no ensino superior, não seria de todo descabido pensar que este fenómeno se encontrasse abolido pelos estudantes, isto se estimarmos que os jovens universitários se encontram numa fase de preparação para a sua futura profissão.

A literatura[1] sobre o fenómeno é vasta. Num estudo pioneiro, levado a cabo em diversas universidades Norte Americanas, os seus autores (Bunn e colegas, 1992) divulgam situações em que 80% dos estudantes inquiridos revelam ter assistido a outros a copiar, bem como já terem presenciado colegas a serem confrontados pelos docentes por se encontrarem a copiar. De acordo com a investigação de Kerkvliet e Sigmund (1999) há uma maior probabilidade de cometer este tipo de fraude quanto mais o estudante se afasta do início do seu percurso académico. Esta probabilidade aumenta igualmente quando o estudante faz a ponderação perante o facto de passar de ano ou reprovar. Em contrapartida, há fatores morais que provocam um efeito contrário, tendo um efeito dissuasor nos estudantes relativamente ao ato de copiar. Às questões morais associam-se as advertências verbais, ou seja, um aviso por parte do professor. Segundo os investigadores a principal questão prende-se com o facto de grande maioria dos alunos não reconhecer este comportamento como sendo grave. Consequentemente, é bem provável que os alunos envolvidos neste tipo de comportamento desenvolvam outras “capacidades” profissionais que não as mais éticas. Estando, por vezes, diretamente relacionados com profissionais inaptos e incompetentes.

2. Se, por um lado, têm sido realizados diversos estudos relativamente à fraude académica no ensino superior, por outro lado seria cientificamente curioso perceber o que acontece em anos anteriores, no 3º ciclo e ensino secundário. Nestes escalões etários revelar-se-ia interessante analisar este fenómeno do ponto de vista do não defraudador, ou seja, do aluno que não pratica a fraude académica. E perceber como este encara o fenómeno. É passível de aceitar que este estudante possa ser confrontado com experiências nefastas no decorrer da sua vida de estudante e que, a um determinado nível, a fraude académica possa significar um dano para os indivíduos que não a praticam… A perceção de injustiça, a ostracização, ver reconhecido o demérito, conformando-se com a sensação de que “o crime compensa”. São perceções vividas que se poderão perpetuar futuramente. Não deixa de ser intrigante o facto de 52% dos inquiridos percecionarem o sistema de justiça como ineficaz no combate à fraude, dados resultantes de um trabalho[2] realizado pelo OBEGEF.

O fenómeno da fraude académica engloba uma problemática aparentemente mais complexa do que se acredita. Os alunos que comentem esta fraude poderão alcançar uma melhor avaliação comparativamente com o esforço gasto no estudo. Não obstante, torna-se difícil para os docentes avaliarem com justiça a aquisição (ou não) de conhecimentos, potenciando uma concorrência desonesta ente os alunos e distorcendo a eficácia do ensino.

Será esta uma visão fatalista, ao relacionar a postura assumida pelos jovens estudantes perante a fraude académica com a corrupção que se verifica em Portugal?

De qualquer forma, será de todo importante perceber porque uns copiam e outros não!

 

NOTAS

[1] Em território nacional têm sido desenvolvidos alguns estudos sobre este fenómeno.

[2] Índice de perceção de fraude em Portugal. Análise para o ano 2016. Consultar em: https://obegef.pt/wordpress/wp-content/uploads/2017/11/wp056.pdf