Carlos Pimenta, Jornal i online

Carlos Pinto Coelho, ilustre locutor, há muitos anos iniciou um noticiário dizendo: “Se começasse dizendo que tudo está bem ninguém acreditaria que estaria a ouvir um noticiário”. Hoje a «informação» faz-se com tragédias, acidentes e mortes.

1. Nos últimos meses os serviços de informação tiveram muitos acontecimentos dramáticos para relatar. Os fogos, os feridos, os mortos, as preocupações das populações, os boatos, as declarações politicas e a vontade de erguer espirais sobre a dor alheia encheram horas de noticiário e comentários, quiçá atiçando a vontade de pirómanos.

E neste redemoinho de notícias se ainda se fizeram referências às medidas estruturais que são necessárias na organização das florestas, quase nunca se recordou que há muitas leis que já procuram minimizar o fenómeno (exemplo: afastamento das árvores da beira das estradas, ausência de floresta e mato junto a populações e casas) e que frequentemente não são cumpridas. E ninguém actua para que tal não aconteça (o que só por si justificaria uma investigação forense!). Há leis que são feitas para não serem cumpridas!

2. Esta afirmação recorda-nos um estudo realizado pelo OBEGEF há uns anos, publicado nos Working Papers (http://obegef.pt/wordpress/?p=3718).

Em 1971 a publicidade nas estradas nacionais passa a ser regulada para não provocar perturbações no trânsito e não pôr em perigo os utentes. Até 50 metros da estrada é totalmente proibida publicidade e qualquer pedido de licenciamento só se aplica para além dos 100 metros. Após 1988,e nas décadas seguintes,as medidas de segurança rodoviária foram reforçadas por preocupações ambientais, podendo-se sintetizar o estabelecido na Lei da seguinte forma:

• A publicidade externa nas estradas nacionais é ilegal fora dos aglomerados urbanos, desde que visível a partir da estrada. Essa proibição visa proteger a paisagem e a natureza.

• A publicidade externa a menos de 50 m da estrada para além de degradar o ambiente é considerada perigosa para a segurança rodoviária. Será ilegal se não for nos aglomerados populacionais. Nestes será ilegal se não estiver em construções existentes no interior do aglomerado.

Se tivermos em conta que as “estradas nacionais” englobam as auto-estradas, os itinerários principais, os complementares e as estradas regionais, facilmente se pode concluir que toda esta legislação é sistematicamente violada.

Alguém se preocupa com isso, apesar das muitas imagens que mostram não apenas a violação da lei mas também o perigo dos outdoors tombando sobre as estradas, degradando-se e soltando peças, desviando a atenção dos condutores? Ninguém. As entidades fiscalizadoras não fiscalizam, o Automóvel Clube de Portugal considera que é «normal» e é problema irrelevante, vários jornalistas afirmaram que não pegavam no problema porque não havia testemunhas de acidentes e mortes, mesmo que tudo indicasse que estas existissem.

3. Nos dois casos houve leis que foram violadas com total impunidade. Sem fiscalização e imposição de cumprimento. Nos dois casos há falta de respeito pela vida humana e pela vivência em sociedade, superados pelo interesse económico de alguns.

A lei é incorrecta? Modifique-se, pressione-se para que seja abolida ou modificada. A lei é correcta? Mantenha-se e pressione-se para que seja melhorada. Em ambos os casos, enquanto são leis apliquem-se!