Nuno Gonçalves, Visao on line,

Os primeiros indícios da aplicação de impostos datam de acerca de seis mil anos, na Suméria, e desde então têm sido verificados, de alguma forma, em praticamente todas as civilizações. A antiguidade dos impostos tem sido naturalmente acompanhada pelas questões sobre o cumprimento das obrigações fiscais.

A evasão fiscal é geralmente definida como o esforço para não pagar impostos através de meios ilegais. É frequentemente contrastada com a elisão fiscal, que se refere ao uso de meios legais para reduzir a carga tributária suportada. A evasão fiscal e a economia paralela são duas realidades distintas estando, no entanto, intrinsecamente ligadas. Por exemplo, o reporte de falsas deduções à coleta não é economia paralela mas trata-se de evasão fiscal; um pequeno negócio que não gera rendimentos passíveis de serem tributados e que funciona de forma informal de modo a evitar uma determinada regulação (p.e., laboral) trata-se de economia paralela mas não é evasão fiscal; já a prestação de um serviço que gera um rendimento tributável mas que não é declarado trata-se de evasão fiscal e economia paralela. A motivação para estes casos está na redução de algum tipo de sobrecarga (fiscal ou de regulação) imposta pelo Estado.

Durante a maior parte do seu desenvolvimento, o estudo do cumprimento e evasão fiscal focou-se principalmente no comportamento dos contribuintes. Somente na última década algum avanço significativo tem sido verificado no que diz respeito ao estudo da influência do comportamento das autoridades tributárias (e governamentais em geral) no dos agentes económicos. Pretende-se nesta crónica reflectir um pouco sobre a influência de algumas das instituições do Estado no comportamento evasivo dos indivíduos.

Na formação da economia paralela, os factores institucionais e psicossociais assumem um papel tão ou mais importante que os factores de ordem económica. Estes definem a percepção dos indivíduos e moldam o seu comportamento face às autoridades. É devido a estes factores que devemos atribuir importância à transparência de decisões e políticas governamentais, à eficácia e eficiência da justiça e da gestão das finanças públicas e à credibilidade das autoridades no combate e na punição da evasão fiscal e da corrupção. A predisposição que os agentes económicos têm em faltar às suas obrigações fiscais e enveredar pela economia paralela é potenciada pelo ambiente em que estão inseridos e pelas suas redes sociais.

Ao pagar impostos, os indivíduos formam uma expectativa de retorno por parte do Estado. O Estado cobra os impostos e gere um orçamento a partir do qual fornece bens públicos, como segurança, defesa, saúde e justiça; faz investimentos no sentido de fomentar o emprego; e providencia protecção social. No entanto, se for ineficiente, sinónimo de menor qualidade institucional, necessita de mais impostos (ou dívida, que implica futuros impostos) para providenciar a mesma ou menor quantidade de bens públicos, investimento e transferências, implicando uma sobrecarga fiscal. Assim, quanto maior a distância apercebida entre o que o indivíduo paga de impostos e o que recebe em troca do Estado, maior a sua predisposição para a economia paralela. Esta distância, traduzida num sentimento de injustiça ou descontentamento, poderá ser demonstrada por vezes através da evasão fiscal. Logo, a transparência na gestão das finanças públicas desempenha um papel muito importante neste processo.

A justiça, como instituição, assume um papel preponderante no comportamento dos indivíduos perante a economia paralela e evasão fiscal. Uma justiça lenta e ineficaz induz um sentimento de impunidade perante a fuga às responsabilidades fiscais. A interação do indivíduo com os seus pares leva à percepção de um risco diminuído em ser devidamente punido por práticas inseridas na economia paralela. Assim, o indivíduo que vive num meio em que proliferam as actividades na economia paralela está mais predisposto a enveredar por estas, uma vez que, do ponto de vista moral não são repudiadas pela sociedade. Existem mesmo sociedades em que não só não é vergonha a evasão fiscal e as actividades paralelas por parte dos indivíduos como é motivo de regozijo perante os seus pares, sinal de inteligência e perspicácia.

A política de combate à economia paralela e evasão fiscal deverá assim depender do contexto a ser implementada, uma vez que os valores, normas sociais, e atitudes diferem consoante os países, e os agentes económicos assumem comportamentos distintos face às autoridades.