Óscar Afonso, Visão online,

Na sequência de uma série de épocas futebolísticas repletas de muitos e grosseiros erros de arbitragem, o fim da presente época desportiva trouxe a polémica dos email.

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Não existe a nível mundial outra actividade desportiva que ocupe um lugar tão central como o futebol, seja nos gostos dominantes, na atenção do público, nos valores monetários envolvidos ou na importância dada pelos órgãos de comunicação social. O futebol é claramente um fenómeno de grande impacto no panorama da cultura desportiva contemporânea em todo o mundo e em Portugal não é excepção, verificando-se a universalidade deste desporto de norte a sul e do litoral ao interior do país.

Sendo verdade que alguns dos melhores praticantes são portugueses, é igualmente verdade que, sobretudo de há uma década para cá, o sonho de carreira é rumar para outros campeonatos, seja pelos valores pagos, pela qualidade competitiva das ligas ou pela verdade desportiva das provas. No mesmo sentido parece ser a tendência recente dos mais novos – e não só – que preferem ver jogos da liga inglesa, espanhola, italiana ou francesa. Tal não é de estranhar se, por exemplo, tivermos em linha de conta a série de acontecimentos ocultos que vão caracterizando a liga portuguesa. Foquemo-nos nos acontecimentos recentes.

Na sequência de uma série de épocas futebolísticas repletas de muitos e grosseiros erros de arbitragem, o fim da presente época desportiva coincidiu – creio que propositadamente – com a divulgação de uma série de emails, alegando um aparente esquema de corrupção na arbitragem portuguesa pelo clube ganhador.

Uns discutem a ilegalidade da fonte dos ditos emails, falando de crimes informáticos, de difamação e de violação de correspondência, ou passaram a sofrer de amnésia como se, no cômputo do que está efectivamente em causa para quem gosta de futebol e da verdade desportiva, isso fosse o mais relevante. Curiosamente tendem a ser os mesmos que, no passado recente, no denominado caso “apito dourado” aplaudiam a passagem de gravações em órgãos de comunicação social, desprezando o segredo de justiça para, em nome da verdade desportiva, atacar o Futebol Clube do Porto (FCP) e o seu Presidente.

A mim, como apreciador de futebol, interessa-me efectivamente saber se agora os ditos emails permitem pressupor ou não a existência de um poder oculto exercido por um clube que, por essa via, desvirtuou a verdade desportiva a seu favor. A ter fé nos ditos emails, cuja existência tanto quanto sei não foi rigorosamente desmentida (se assim fosse não seria, por exemplo, abordada a questão da (i)legalidade das fontes), temos estado perante um aparente esquema que envolve nomeações, promoções e classificações de árbitros, assim como relações promíscuas entre dirigentes desportivos. Não sei, portanto, se tal é verdade, meia verdade ou não, mas sei com toda a certeza que “não há almoços grátis”. Sei também que tal estado de coisas sugere, por um lado, que o sucesso desportivo tem estado fortemente associado a poderes ocultos e, por outro, que o futebol doméstico está cada vez pior.

Digo cada vez pior porque, no passado recente, passou-se a ideia que o FCP ganhava porque controlava o tal poder oculto, mas curiosamente ganhava também lá fora. Assim se explica que o presidente do FCP não tenha sido condenado pela prática de qualquer crime e que no campeonato português actuassem alguns dos melhores jogadores. Agora, a ser verdadeiro o novo poder oculto, o sucesso do clube ganhador tem-se apenas limitado ao contexto nacional e aparentemente já se decretou que nada há para investigar. Parece-me ser esta a conclusão a retirar de afirmações do tipo “há que ser célere” na resolução do assunto. O que significa a necessidade de ser célere no contexto de uma justiça tradicionalmente lenta? Encobrimento?! Parece-me ser igualmente essa a conclusão a retirar do facto da liga de clubes priorizar a discussão de temas irrisórios como os “cigarros electrónicos”, deixando na gaveta tantos assuntos efectivamente relevantes.

Mas o estado de coisas revela também a mesquinhez e a inveja do sucesso dos outros. O que no passado recente se fez ao FCP foi, naturalmente, estancar o seu sucesso interno, mas também e sobretudo o seu sucesso externo. É por estas e por outras que, creio eu, há cada vez mais jogadores de menor qualidade no campeonato português e que há cada vez mais audiência dos jogos de outras ligas.