Rute Serra, Visão online,

 

Sempre que efetuamos compras num supermercado, nos inscrevemos num ginásio, aderimos a serviços, contratamos um seguro, sub-rogamo-nos às cláusulas contratuais gerais, previstas unilateralmente, sem negociação ou destinatários pré-determinados..

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Contratar é um ato empedernido de marca (aparentemente) indelével, nas nossas vidas. Com o advento das sociedades industrializadas e tecnicamente desenvolvidas, alteraram-se naturalmente os pressupostos do iter negotii: da fase negociatória preliminar, em que ambas as partes, no uso discricionário de opção, livremente estabeleciam os termos contratuais adequados, para a celebração do negócio jurídico, encontramos hoje os “contratos de adesão”, cujo conteúdo clausular pré-estabelecido, nem sempre respeita os interesses dos consumidores.

Em causa está, portanto, a autonomia da vontade das partes, a “potencialidade jurígena do comportamento humano livre”, nas palavras do Prof. Menezes Cordeiro.

Com efeito, sempre que efetuamos compras num supermercado, nos inscrevemos num ginásio, aderimos a serviços de telecomunicações, gás, água, fornecimento de energia, contratamos um seguro ou inclusive um empréstimo hipotecário, sub-rogamo-nos às cláusulas contratuais gerais, previstas unilateralmente, sem negociação ou destinatários pré-determinados. Estas devem ser redigidas em obediência ao princípio da “boa-fé” (e do seu corolário – o princípio da “confiança”) e do “equilíbrio”, porém, ocorre frequentemente uma tensão entre a liberdade e a justiça contratual.

Esta tensão culmina por vezes em abusos, provenientes de desequilíbrios significativos na posição negocial. Referimo-nos ao clausulado contratual abusivo, promovido pelas empresas, contra os consumidores.

Ao abrigo da legislação europeia, as cláusulas contratuais abusivas não possuem valor jurídico, nem são vinculativas para os consumidores. Por outro lado, se destes contratos emergir uma cláusula com estas características, tal não implica a invalidade da totalidade do contrato, mas tão só daquela disposição concreta. Ao legislador nacional compete adequar a proteção do consumidor neste conspecto, aos normativos comunitários, profusos, através da atuação (eficaz), das várias autoridades competentes.

O consumidor (a par do Ministério Público), possui legitimidade ativa para intentar judicialmente uma ação inibitória, contra a empresa prevaricadora, no sentido de ver declarada nula, a cláusula abusiva.

No entanto, os meios alternativos de resolução de litígios, estão também ao dispor dos potenciais lesados. A crescente tendência para a obtenção de bens através de plataformas online, promove a querela do consumo, nem sempre fácil de dirimir, considerando as díspares localizações geográficas, do fornecedor e do comprador, do bem. Consciente desta realidade, a União Europeia criou um sítio web, dedicado à resolução extrajudicial de conflitos de consumo, utilizável gratuitamente.

A existência do Registo Nacional de Cláusulas Abusivas, disponível online, permite uma indireta proteção ao consumidor, contra as cláusulas anteriormente julgadas nulas, pelos tribunais. Com efeito, a declaração judicial de nulidade aproveita a todos os consumidores que, no seu contrato, constatem a existência de qualquer cláusula já julgada nula, pelas instâncias adequadas.

Para que a ordem possível não seja a ordem da desordem.