Mariana Fontes da Costa, Visão online,

 

 A política de remuneração do pessoal responsável pela avaliação de solvabilidade do consumidor no crédito à habitação deve prever medidas destinadas a evitar conflitos de interesses (Artigo 7.º, n.º 3, b) da Diretiva 2014/17/UE)

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Conforme se mencionou já em crónica anterior, o Parlamento Europeu e o Conselho da União Europeia adotaram, em 4 de fevereiro de 2014, a Diretiva 2014/17/UE, relativa aos contratos de crédito aos consumidores para imóveis de habitação (doravante designada “Diretiva”), com o intuito primordial de combater as principais causas que propiciaram as elevadas taxas de incumprimento do crédito à habitação um pouco por toda a Europa na sequência da crise económico-financeira que se fez sentir nos últimos anos. Apesar de o período para a sua transposição ter já terminado no dia 21 de março, o Estado Português não procedeu ainda a essa tarefa, permanecendo incógnito o modo como, em Portugal, se irá dar cumprimento a estas exigências reforçadas de proteção e transparência.

Se parece poder afirmar-se que a Diretiva ficou aquém do esperado em muitos e muito relevantes aspetos, não dando resposta satisfatória ao problema da subsistência de valor remanescente de dívida mesmo após a execução da hipoteca e venda judicial ou adjudicação do imóvel, noutros aspetos as soluções configuradas pela Diretiva apresentam-se dotadas de uma operacionalidade perentória digna de louvor e a sua transposição proporcionará um aumento da transparência, imparcialidade e controlo de risco na concessão do crédito à habitação.

Dentro deste último grupo de medidas, merece especial destaque, pelo papel nefasto que a falta da sua regulamentação desempenhou na crise do subprime, a matéria da remuneração dos funcionários das instituições que concedem crédito à habitação, bem como dos intermediários de crédito, do seu pessoal e representantes nomeados.

Em aberto combate aos conflitos de interesse que permeavam a prática remuneratória do setor, o artigo 7.º da Diretiva consagra, no seu número 2, uma norma geral que obriga os Estados-Membros a adotarem medidas que assegurem que a forma como as instituições que concedem crédito à habitação remuneram o seu pessoal e intermediários de crédito, e o modo como estes remuneram o seu pessoal e os seus representantes nomeados não põe em causa o dever de todas estas categorias profissionais agirem “de forma honesta, leal, transparente e profissional, tendo em consideração os direitos e interesses do consumidor”.

Mas o legislador comunitário vai mais longe, concretizando essa norma geral nos números seguintes do referido artigo 7.º, com medidas diretas e claras de combate aos conflitos de interesse nesta matéria.

Assim, quanto às políticas de remuneração do pessoal responsável pela avaliação de solvabilidade do consumidor estabelece-se diretamente que esta remuneração não pode depender do número ou da proporção de pedidos aceites [art. 7.º, n.º 3, b)]. Por sua vez, quanto à remuneração do pessoal que preste serviços de consultoria, a estrutura da sua remuneração não pode depender de objetivos de vendas, sendo dada liberdade aos Estados-Membros para, em cumprimento deste objetivo, proibirem o pagamento de comissões pelas entidades que emprestam o dinheiro aos intermediários de crédito (art. 7.º, n.º 4). Os Estados-Membros podem ainda proibir ou impor restrições ao pagamento de consumidores às instituições que concedem o crédito ou a intermediários de crédito antes da celebração do contrato pelo qual o crédito é concedido.

É expectável que estas medidas tenham um impacto europeu positivo na promoção da salubridade de um setor particularmente exposto a opacidades, combatendo e reduzindo incentivos a distorções com reflexos diretos na vida dos cidadãos.