Óscar Afonso, Jornal i Online
Os paraísos fiscais são vistos como algo de “mau”, porque, efectivamente, podem também servir de abrigo a capitais obtidos de forma ilícita
O nome “Paraíso” adicionado do termo “Fiscal” deixa de ser visto como algo de muito “bom” para passar a ser visto como algo muito “mau”. A verdade, porém, é que a maioria desconhece o respectivo conceito, o seu funcionamento e a motivação para a sua existência, assumindo-se que é algo de “mau” porque supostamente são utilizados pelos ricos para fins ilícitos.
Os paraísos fiscais existem num número muito significativo de países e territórios, e em todos os continentes, tendo-se desenvolvido em paralelo com o desenvolvimento económico mundial, com a globalização dos mercados e da produção, e a formação dos grandes blocos económicos. No essencial o que está em causa é a facilidade na atribuição de licenças para a abertura de empresas, a isenção de tributação ou tributação com base em taxas anormalmente baixas, de modo a atrair capitais em montante significativo, protegendo a identidade dos proprietários com sigilo bancário absoluto. São geralmente avessos à aplicação das normas de direito internacional, possuindo legislação “flexível” para a constituição de sociedades, absoluta liberdade cambial, sistemas financeiros e de comunicações muito eficientes, e localização em território com estabilidade política e social. Trata-se portanto de algo a que só os ricos podem aceder e daí a designação de “Paraiso dos ricos”.
Pode ainda afirmar-se que há uma certa especialização dos paraísos fiscais. Se se pretende desenvolver a marinha mercante, então tende a usar-se o Panamá ou a Libéria. Se o que está em causa é um regime especialmente favorável para as holdings e a colocação de empréstimos externos então a opção parece ser o Luxemburgo ou a Holanda. Recorre-se ao Liechtenstein pelas vantagens oferecidas às sociedades, às fundações e às fortunas privadas. A Suíça é procurada pela baixa tributação e pelo sigilo bancário. E o Uruguai, por exemplo, apresenta liberdade cambial e também sigilo bancário.
Os capitais colocados nos paraísos fiscais podem naturalmente ter origem legal e há um conjunto de usos “legítimos” da sua actividade. No entanto, os paraísos fiscais são vistos como algo de “mau”, porque, efectivamente, podem também servir de abrigo a capitais obtidos de forma ilícita – lavagem de dinheiro – e usados com finalidades criminais; por exemplo, os valores usados por terroristas ou outros criminosos que se aproveitam das vantagens do sigilo e da facilidade de movimentação de dinheiro oferecidos por alguns paraísos fiscais para financiar as suas actividades criminosas. Por outro lado, pelas suas características, os paraísos fiscais podem ser utilizados para fraudes financeiras e comerciais e para a criação de organizações fantasma. São pois ponto de encontro entre o legal e o ilegal.
Além disso, contribuem para uma injustiça tremenda na economia mundial que dificilmente pode ser medida, decorrente do valor dos lucros não sujeitos a impostos ou sujeitos a impostos irrisórios. O que se perde em impostos cobrados é naturalmente o suficiente para fazer uma grande diferença nas finanças de muitos países. Ou seja, o dinheiro “limpo ou sujo” neles aplicado priva os países de receitas fiscais, tem implicações para as empresas legais, aumenta as despesas públicas em serviços de segurança e serviços de polícia, aumenta prémios associados a apólices de seguros e mina os padrões alcançados ao nível dos direitos humanos, especialmente quando se leva em conta actividades como o tráfico de pessoas, o sequestro e a extorsão.
Dizer ainda que é estranho que instituições oficiais como o Fundo Monetário Internacional, o Banco Mundial, a OCDE ou o G20, assim como vários bancos centrais, dediquem tão poucos recursos à investigação deste sector, sendo que dispõem atualmente de grande parte da informação necessária para poderem atuar.