Orlando Mascarenhas, Visão online,

 

“O dinheiro é o principal meio de pagamento dos crimes financeiros, principalmente no caso de branqueamento de capitais, corrupção e financiamento do terrorismo. E quando dizemos «dinheiro», estamos principalmente a falar de nota de elevado valor, como a de 500 euros”.
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O dinheiro é a fonte mais direta de fundos provenientes de crimes que visam fundamentalmente a obtenção de um benefício económico, tais como o tráfico de droga, rapto, extorsão, contrabando, tráfico de armas, tráfico de pessoas ou fraude fiscal. Ao mesmo tempo, o dinheiro, é também uma fonte direta de benefícios económicos de outros crimes graves, como a corrupção. O dinheiro desempenha um papel fundamental no fomento do crime, devido à sua liquidez e forma anónima de transação.

Na Europa Ocidental e na América do Norte, têm sido defendidas medidas de limitação de uso do dinheiro nos mercados, potenciando-se uma sociedade sem dinheiro, para evitar crimes associados aos pagamentos através desta forma. Um relatório da OCDE afirma que, quanto mais cedo o mundo mudar para uma economia sem dinheiro, melhor segurança pública e segurança nacional poderá ser alcançada.

As reformas que apoiam um sistema sem dinheiro iniciaram-se já na União Europeia. Em França, os residentes fiscais, não podem realizar transações em dinheiro superiores a 1.000 euros por compra, tendo a Itália adotado medidas semelhantes pata limitar as transações em numerário. Na União Europeia, existem já países, tais como a Suécia, que as transações em dinheiro são apenas 3% do valor total de transações, sendo 9% a média na União Europeia e 7% nos Estados Unidos da América.

“O dinheiro é o principal meio de pagamento dos crimes financeiros, principalmente no caso de branqueamento de capitais, corrupção e financiamento do terrorismo. E quando dizemos «dinheiro», estamos principalmente a falar de nota de elevado valor, como a de 500 euros”.

Frases e ideias como esta, foram já pensadas e proferidas recentemente, em concreto no mês passado, por altos responsáveis pelas políticas monetárias europeias, em particular o BCE,  e outros organismos ligados ao combate à criminalidade económico-financeira organizada como é o caso do OLAF – European Anti-Fraud Office.

Enquanto, de uma forma geral, se tem dado uma importância elevada, face à também elevada preocupação de uma utilização inadequada das moedas virtuais por parte dos criminosos, o que é certo, é que, os criminosos, no que ao financiamento de terrorismo e branqueamento de capitais diz respeito, continuam a utilizar as técnicas tradicionais de branqueamento, em particular, o uso de dinheiro, ou como vulgarmente é conhecido, a utilização em “cash”.

O dinheiro, em “cash”, é fortemente usado para pagamentos de baixo valor, e o seu uso para fins de transações é estimado em cerca de 1/3 das notas totais em circulação, sendo que, na União Europeia, o uso do “cash” é a principal razão para o acionar das comunicações de transações suspeitas ocorridas no sistema financeiro.

Atendendo ao constante desenvolvimento na deteção de movimentos suspeitos nas operações de transações no mercado bancário, os grupos criminosos centram a sua atenção no dinheiro para branquear as vantagens dos crimes, tendo tomado uma relevância muito acentuada nos últimos anos a transferência física de dinheiro, através das fronteiras,  como um método comum utilizado no branqueamento de capitais.

Mas, porquê que os criminosos usam o dinheiro em “CASH”?

Existem muitas formas de branquear os proventos de crimes e todas possuem certos fatores em comum, tais como: a necessidade de esconder a origem e o verdadeiro “dono” dos proventos;  a necessidade de, direta ou indiretamente, manter controle sobre os proventos; a necessidade de mudar a forma dos proventos, para que, se encolha o elevado volume de “cash” gerado pela atividade criminosa ou cortar a ligação com a criminalidade subjacente.

O dinheiro em “cash” preenche todas estas necessidades, pois é um instrumento negociável ao portador, pertencendo à pessoa que o detém.

Apesar de não existirem números que possam fornecer a proporção de dinheiro em circulação utilizado para fins legais e ilegais, segundo as investigações desenvolvidas pelas diversas forças de segurança, confirma-se que o dinheiro, em particular as notas de elevado valor facial são usadas regularmente pelos grupos criminosos como facilitadoras do branqueamento de capitais.

Enquanto nem toda a utilização de dinheiro é crime, praticamente todos os criminosos utilizam o dinheiro em algum momento durante o processo de branqueamento de capitais.

Indicadores de investigações internacionais de branqueamento de capitais, revelam que as notas de 500 Euros são a ferramenta favorita dos criminosos para guardar os proventos das atividades ilegais em ambientes não financeiros e, exemplo disso mesmo, num recente caso investigado pelas autoridades portuguesas em que um General Angolano é suspeito de estar envolvido em branqueamento de capitais em Portugal, conduziu à apreensão de 8 milhões de euros em notas de 500 Euros, que se encontravam no interior de um imóvel.

Os criminosos transportam dinheiro através das fronteiras, escondendo-o. Cada vez mais são encontradas grandes quantias de dinheiro em bagagem de avião e em bagagem de mão, com recurso às notas de 500 Euros. Permite este artefacto transportar uma maior quantidade de dinheiro. A título de exemplo, verifique-se que, 1 milhão de Euros são exatamente 2000 notas e pesam 2,2 quilos e ocupam um espaço de 3 litros, o que, facilmente cabe no interior de uma mala de computador portátil. A mesma quantia de 1 milhão de Euros, em notas de 50 Euros, equivale a 20.000 notas com um peso de 22 quilos. Neste caso, ocupam o espaço de uma mala de viagem.

Sendo o dinheiro potenciador do branqueamento de capitais e também do financiamento do terrorismo, medidas de controlo e fiscalização são fundamentais para prevenir estes processos criminais. O limite do uso de dinheiro nas transações comerciais, bem como a saída de circulação de moeda de valor facial muito elevado como é o caso da nota de 500 euros, serão tão mais eficazes, quanto mais forem aplicadas a nível global, como também, sendo acompanhadas por outros mecanismos de controlo preventivo, onde, e por agora, apenas se refere a importância que reveste o fim do anonimato nos centros offshore, como medida para esse efeito.