Pedro Moura, Visão online,
"Growth for the sake of growth is the ideology of the cancer cell”, Edward Abbey
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É simples roubar os filhos. Se no presente eles têm poucas coisas materiais de valor, no futuro deverão já possuir algo que valha a pena roubar.
E como bons consumidores (cidadãos?), se pudermos deitar a mão a qualquer coisa, é precisamente isso que vamos fazer. Mesmo que seja para roubar o futuro aos nossos filhos.
A receita mais em voga é muito simples: montar um sistema social e económico que, na sua base, assenta:
- numa política de produção, consumo e desperdício infinitos de tudo o que se possa produzir, vender, usar e deitar fora, baseada numa política de ‘escassez’ permanente (nunca se tem o suficiente), e de criação e manutenção de sentimentos de permanente insegurança pessoal que levam à necessidade de afirmação pessoal e social através da posse e da ostentação;
- no uso intensivo de recursos naturais não renováveis que tendem a esgotar-se para sempre, para suportar este ciclo, comprometendo existências para as gerações futuras;
- numa política e cultura (tradição) de organização social e económica baseada numa visão distorcida de ‘trabalho’ e ‘pleno emprego’ (parecida com esclavagismo), totalmente contraditória com o aumento crescente de produtividade derivado da evolução da tecnologia, que funciona complementarmente para alimentar o ciclo de produção e consumo, destruindo qualquer possibilidade de melhoria das condições objetivas de bem estar e da capacidade de crescimento espiritual das pessoas e comunidades;
- num terceiro pilar económico de um sistema económico baseado em divída (contraída no presente para ser paga por alguém em futuros cada vez mais distantes) que embora não sendo tão grave quanto a eliminação definitiva dos recursos naturais e da ‘saúde’ do planeta, serve para criar e manter um sistema de dependência e compromisso negativo para as gerações seguintes, diminuindo as possibilidades de mudança;
- num absurdo paradigma de crescimento (económico) contínuo e infinito, que suporta todos os pontos anteriores, e que já se provou ser incompatível com qualquer tipo de futuro em que habitem seres humanos neste planeta (os nossos filhos ou outros).
Como se chegou aqui? Não importa realmente muito. Atribuir a responsabilidade aos que passaram ou simplesmente encolher os ombros porque ‘é mesmo assim’, mais que raiar o criminoso, é simplesmente estúpido. É a economia, estúpido? Talvez, não sei. Mas certamente são os nossos filhos, estúpido.
Mas o que tem isto tudo a ver com fraude? Por definição ‘fraude’ é a apropriação indevida e abusiva de bens ou serviços a outrem para benefício próprio e/ou de outros. Parece-me que o roubo que estamos a fazer negligentemente aos nossos filhos é a maior fraude de que já tive notícia, com um refinamento muito especial: é feita no futuro para gozarmos no presente.
Em artigos próximos abordarei estas temáticas numa ótica construtiva de como desmantelar esta gigantesca máquina de fraude.
No entretanto, vou continuar a roubar os meus filhos do seu futuro e a sentir-me miserável com o meu próprio comportamento.
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