José António Moreira, OBEGEF

 

“La corrupción es una empresa criminal más difícil de combatir que las guerrillas y las bandas criminales”

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No início de setembro desloquei-me à Colômbia, para participar num congresso que teve lugar na cidade de Medellín, capital do distrito de Antioquia. À simples menção do nome da cidade, quando referia a intenção de para lá viajar, a face de quem me escutava fechava-se, um ar de preocupação sobrevinha. Pontualmente, um aviso sobre cuidados a ter.

Tinha perceção da imagem da Colômbia como país violento, e em particular da imagem colada à cidade para onde me dirigia, devido ao narcotráfico e ao famigerado “Cartel de Medellín”. As negociações com a guerrilha, as denominadas FARC, que em pequenos passos têm vindo a produzir frutos, têm ajudado a diluir essa imagem, tornando-se cada vez mais uma triste memória do passado. Não se fique com a ideia, porém, de que o país se tornou um lugar pacífico. Longe disso. Para os padrões europeus, é e continuará a ser ainda por muito tempo uma sociedade muito violenta.

No distrito de Antioquia, que tem cerca de 6,3 milhões de habitantes, dos quais quase 4 milhões vivem na grande Medellín, a capital, no ano de 2014 foram cometidos 19140 homicídios (em Portugal, em 2013, para cerca de 10 milhões de habitantes, foram cometidos menos de 200). Porém, se se tiver em consideração que em 2012 aquele número fora de 59737 homicídios, fica de imediato a ideia de uma evolução deveras positiva, mas que se situa ainda a níveis incomportáveis.

Além disso, nem só de homicídios se compõem a violência em Antioquia. Muito em especial nas zonas do distrito onde se pratica o garimpo e mineração selvagens, ou o cultivo de droga, áreas que habitualmente são controladas por gangues e guerrilhas, a violência é feita também de (muitos) desaparecimentos, de intimidações que levam os residentes a fugir, de violência sobre e assassinatos de defensores de direitos humanos e de jornalistas.

Em termos geográficos, a cidade de Medellín, nos Andes colombianos, espraia-se a perder de vista, pelas encostas ingremes de um profundo vale onde corre um pequeno rio, o Aburrá. De longe, a visão que proporciona é de que essas encostas estão forradas de mosaico castanho, que transparece no meio de uma constante neblina de poluição. Ao perto, constata-se que o acastanhado advém da cor do tijolo em bruto de que são feitas as imensas “favelas” que trepam encosta acima de ambos os lados do vale.

O perfil da cidade espelha a extrema desigualdade social que é tão caraterística das sociedades sul-americanas. O sul da cidade é cosmopolita, moderno, cheio de arranha-céus, espantosos edifícios envidraçados, jardins, alamedas. Não se distingue, para quem chega e se limita a ficar num dos hotéis de muitas estrelas que nessa zona se situam, do cenário de uma qualquer moderna cidade europeia ou americana. Preponderam nesta zona pessoas de tez branca.

À medida que se percorre a cidade em direção a norte, a poluição do ar aumenta, as barracas aparecem em força, a tez da pele das pessoas torna-se mais escura, as condições de vida mais degradadas. A cor do tijolo sobrepõe-se ao verde das árvores, que começam a rarear para dar lugar à extrema concentração de habitações encavalitadas umas em cima das outras.

Aos olhos dos turistas, o cenário visto de longe até nem é desagradável. O metro de superfície, os teleféricos que passam por cimas de favelas, algumas escadas rolantes que sobem pelo meio de bairros, são meios de transporte que aqueles não desdenham de utilizar, porque são baratos e porque o trânsito rodoviário é caótico. Permite fotografias espantosas, que ficam bem nas redes sociais, sobretudo se incluírem habitantes locais, pessoas afáveis, sempre prontas a ajudar.

Perante as ostensivas desigualdades sociais, perguntei-me como se posicionaria o país em termos de corrupção. Como previra, a posição relativa do país não é boa. No conjunto do continente americano, situa-se a meio da tabela, tendo no extremo mais favorável o Canadá, no outro a Venezuela. A nível mundial, a Colômbia, segundo a Transparência Internacional, situa-se na posição 94 (Portugal na 31) entre 175 países considerados.

Apraz registar, no entanto, que a corrupção parece ser também uma preocupação das autoridades. No dia 8 de setembro, teve lugar em Medellín o encontro anual denominado a “Feira da Transparência”, que reuniu num parque as autoridades municipais e distritais às forças vivas da região, para discutirem durante um dia as questões da corrupção.

O governador de Antioquia, Sergio Fajardo, na sua intervenção, recordou que estivera na génese do surgimento desse encontro anual, 11 anos antes, quando era alcaide da cidade, e relembrou a frase com que então o tema da corrupção fora lançado: “La corrupción es una empresa criminal más difícil de combatir que las guerrillas y las bandas criminales”.

A Colômbia é, pois, um país que luta em muitas frentes. Cada uma mais difícil que a outra. Aposta numa estratégia que tem condições para ser ganhadora: o investimento na educação das suas gentes.