Henrique Santos, Visão on line,

Deixei de agradecer ao funcionário judicial depois de qualquer troca de impressões na secretaria.

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“Antigamente dizia “muito obrigado e bom dia” antes de sair. Agora (...) saio.”

 Alguém um dia me disse que “as opiniões são como as desculpas, todos as dão, mas ninguém as quer ouvir”, por isso, vou escrever à vontade o que ninguém vai ler.

Parece que os funcionários judiciais vão ter de seguir um “código de conduta”, de procedimentos, legalmente previstos. Mal vamos nós quando temos de definir, por decreto, aquilo que cada um devia fazer enquanto pessoa inserida em sociedade.

Vejamos o excerto da legislação:

(…) Artigo 5.º: O aviso referido nos artigos anteriores deve ser afixado na porta de todas as secretarias judiciais em letras bem visíveis em fundo contrastante, nos termos da alínea a) do presente artigo (...):
a) Neste local não sei aceites gratificações de qualquer tipo, e o utente deve abster-se de tal prática sob pena de ser pronunciado pelo Ministério Público como incitador ao crime de corrupção.
b) Todo e qualquer cidadão, deve abster-se de cumprimentar os funcionários judiciais com aperto de mão ou outro que implique contacto físico, ou de realizar cumprimento que evidencie leve sorriso ou simpatia com um funcionário em particular. (...)

Agora, quando entro a secretaria judicial, peço licença, cumprimento todos em simultâneo e faço questão de falar bem alto quando me dirijo a um funcionário em particular, despojando-me à entrada do casaco e arregaçando as mangas. Quando saio, nunca viro as costas, cumprimento todos sem exceção, e faço questão de mostrar que levo tudo o que trago.

Na rua deixei de cumprimentar algumas pessoas (os funcionários judiciais). Se entro num restaurante e reconhecer que está lá a almoçar um funcionário judicial, saio do estabelecimento, aguardo que ele saia, e só depois entro.

Deixei de agradecer ao funcionário judicial depois de qualquer troca de impressões na secretaria. Antigamente dizia “muito obrigado e bom dia” antes de sair. Agora, mal termino o que tenho a fazer, olho seriamente para o funcionário judicial (como se tivesse paralisia facial) e saio. Já vi um colega dizer “obrigado”, e um dos funcionários de imediato se levantou e foi fazer queixa à delegada do ministério público...

Existem já secretarias judiciais a usar burcas para que seja impossível detetar a pessoa que está dentro (talvez venham a disponibilizá-las à entrada do serviço para que os utentes também as usem).

De facto eu estou a exagerar (até o artigo da legislação inventei), mas custa-me que, em pleno século XXI, em Portugal, seja necessário este tipo de procedimento, para situações que de forma natural já deviam ter deixado de acontecer há muito tempo.

Definir por Decreto o que são presentes admissíveis e não admissíveis é o fim da picada! Se tal procedimento fosse para fazer, então devia simplesmente passar pela proibição total.

O que falta é a formação ética das pessoas, o que sobra é a iliteracia económico-financeira que muito ajuda para agravar a situação. Bem sabemos que é uma solução que demora a dar frutos, mas é nos bancos das escolas (já para não falar em casa), desde muito cedo (e não só nas universidades), que estas temáticas devem ser abordadas. Infelizmente, há quem não perceba isto.

Enquanto fizermos legislação para culpar e penalizar as pessoas por atos cometidos sem que estas se sintam culpadas, só vamos levar a que as mesmas se sintam injusticadas e tentem depois, por si, reparar a injustiça que cometeram contra ela (com as consequências que nós bem conhecemos).

Não sei se compreenderam o alcance da questão, mas como também não leram a minha opinião, acho que não vale a pena ser mais claro. Está muito bem assim.

Se não concordar queixe-se, talvez eu lhe dê alguma desculpa...