Jorge Alves, Visão on line,

Acabaram de me telefonar a informar-me que tinha sido contemplada com um prémio no valor de 400€, mas tenho que me deslocar à cidade hoje à tarde para receber o dinheiro.

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Era sábado de manhã e sem que estivesse a contar o telemóvel tocou. Era a minha tia Odete -nome fictício - que me ligava eufórica. A minha tia é uma senhora de idade que mora numa pequena aldeia com poucos habitantes e escassas ligações aos centros urbanos. Depois dos cumprimentos habituais, começou por me perguntar: - Por acaso não estás a pensar passar por cá hoje? Eu respondi: - Não estou, mas se for necessário posso passar. O que aconteceu? - Acabaram de me telefonar a informar-me que tinha sido contemplada com um prémio no valor de 400€, mas tenho que me deslocar à cidade hoje à tarde para receber o dinheiro. Como hoje não há transporte queria saber se poderias passar por cá para me levares à cidade.

Depois de ouvir a senhora que parecia irradiar alegria, comecei logo por lhe referir que aquilo me parecia tratar-se de um logro. E de repente lembrei-me que há anos atrás também a tinham contactado para receber um prémio, tendo regressado a casa com um faqueiro que acabara por comprar, que de pouco lhe serviu e sem qualquer prémio. A tia Odete continuava a insistir. – Não! Disseram-me que fui selecionada e que me vão entregar 400€. Ao que eu perguntei: - E por que motivo foi selecionada? – Pelos vistos há uns tempos atrás telefonaram cá para casa e pediram-me para responder a um questionário sobre problemas de saúde. Como sabes, tenho alguns problemas de coluna.

Não queria acreditar na forma entusiasmada como a tia Odete me contava estas coisas. Voltei a perguntar: - Qual a razão para alguém lhe fazer tal oferta? A tia Odete acabou por me dizer que era uma clínica e que lhe garantiram que caso se apresentasse no local e hora solicitada receberia os 400€. Voltei a fazer-lhe sentir que essa oferta não fazia qualquer sentido, desaconselhando-a a não se deslocar a tal lugar. A tia Odete só me dizia: - Eu não assino nada! Não assino nada! Tentei, uma vez mais, dissuadi-la, mas a “menina” que a contactou naquela manhã deve ter apresentado argumentos bem mais convincentes que os meus.

A meio da tarde, recebo uma chamada de um número desconhecido. Era a tia Odete que agora ligava de um telemóvel a pedir-me que falasse com a “menina” da clínica. Nem queria acreditar. A “menina” começou por se apresentar como sendo de uma clínica e que estava a demonstrar à minha tia que o aparelho terapêutico que lhe expunha era uma boa opção: - Uma poltrona de massagens no valor de 2.400€, com uma mensalidade de 40€ durante 5 anos. Uma verdadeira pechincha. Respirei fundo para tentar ser educado e referi-lhe: - Independentemente da qualidade do produto em causa, a minha tia, que recebe uma reforma inferior a 400€ por mês, não tem condições para pagar o valor indicado e eu desaconselho-a a realizar tal compra. A “menina” tentou explicar-me mais uma vez as vantagens do produto e que a minha tia já tinha experimentado, acompanhada por uma suposta médica, os prodígios do mesmo. Voltei a referir à “menina” que a pessoa em causa não teria condições para cumprir o plano de pagamentos apresentado e que eu tudo faria para a convencer a anular aquela operação.

Dias mais tarde, fui visitar a tia Odete, que já havia tomado consciência da mentira que lhe pregaram. Perguntei-lhe então se tinha alguma informação sobre a clínica que lhe queria oferecer os 400€. Foi quando me mostrou um vale de desconto de 400€ para compra de produtos comercializados pela empresa. Numa breve pesquisa na internet, rapidamente percebi que não se tratava de nenhuma clínica, mas sim de uma empresa que vende desde camas de automassagem a jogos de cama para criança. No site da empresa é possível verificar que a poltrona de massagens de maior valor ascende a 2.200€.

Pelos vistos, esta é uma situação pela qual muitas pessoas, sobretudo idosas e com telefone fixo, já passaram e que muitas vezes acabam por ser ludibriadas, comprando produtos que não necessitam e a preços exorbitantes. Como desconhecem os direitos dos consumidores, acabam por consentir e assumir compromissos para alguns anos que depois se tornam difíceis de cumprir.

Como diz o ditado: “Não há duas sem três!” A tia Odete já foi contemplada duas vezes, será que à terceira ganha mesmo o prémio?