Mariana Costa, Visão on line,

Em 1937, no seu artigo The nature of the Firm (Economica, vol. 4, n. 16, 386ss), o economista Ronald Coase alertava para a essencialidade da celebração de contratos de longa duração na atividade empresarial.
Estes contratos, que têm como principal virtualidade o aumento da segurança na obtenção dos bens ou serviços necessários à atividade da empresa, acarretam o enorme perigo do compromisso jurídico face a um futuro desconhecido. E quanto maior for a duração do contrato e o seu grau de detalhe, maior é o risco de que o tempo exerça a sua ação modeladora das circunstâncias e de que a disciplina prevista pelos contraentes no presente se torne um pesado fardo, ou até um insuportável fardo, no futuro (pense-se num contrato de fornecimento de tecnologia que entretanto se tornou obsoleta – v.g., as antigas cassetes de música – ou de bens, cujo preço de mercado sofre uma subida muito acentuada, durante a vigência do contrato – v.g., as diversas crises do petróleo após a segunda guerra mundial, datando a mais recente de 2008).
Reconhecer a incerteza associada à passagem do tempo implica aceitar que os contratos de longa duração não podem, nem devem, ser exaustivos, cabendo às partes deixar uma margem de concretização (ou adaptação), em função das circunstâncias reais.
Ora, se a rigidez da disciplina contratual de longa duração impede o contrato de se adaptar às alterações das circunstâncias envolventes, podendo em última ratio torná-lo excessivamente oneroso para uma ou ambas as partes, por outro lado, a flexibilidade e incompletude da disciplina contratual abre a porta a comportamentos oportunísticos, sobretudo em épocas de grande instabilidade económica, como a que vivemos presentemente.
O conceito de oportunismo, usado neste contexto de comportamento estratégico, corresponde essencialmente à atuação consciente e voluntária de uma ou várias partes contratantes, no sentido de contornar as cláusulas do contrato, aproveitar lacunas de regulamentação, forçar abusivamente interpretações ou adaptações contratuais explorando as fragilidades da(s) outra(s) parte(s), com o objetivo de maximizar os benefícios para si resultantes do negócio (de forma desenvolvida, veja-se O. Williamson, The Economic Institutions of Capitalism, The Free Press, 1985).
É o exemplo clássico do franquiado free rider, que beneficia abusivamente da boa imagem associada à marca do franquiador e presta serviços de qualidade inferior à exigida pela relação de franquia, reduzindo dessa forma as suas despesas. É ainda o exemplo do fornecedor, que sabendo que o adquirente necessita dos bens com urgência e que este não conseguirá encontrar bens substitutos em tempo útil, se recusa a efetuar a entrega sem renegociação, para cima, do preço estabelecido no contrato.
Quanto maior for a especificidade dos bens ou serviços contratados, o investimento inicial não reembolsável efetuado com vista ao decurso da relação contratual, a preeminência de uma parte em relação à outra (…) maiores são os riscos de comportamento oportunístico no decurso da relação contratual.
É certo que o ordenamento jurídico disponibiliza alguns instrumentos adequados para combater o comportamento oportunístico. Porém, as dificuldades associadas ao ónus da prova, a demora na obtenção de sentença judicial e a tantas vezes ténue fronteira entre comportamentos lícitos e ilícitos tornam particularmente difícil o combate ao oportunismo subtil, no contexto do direito dos contratos.
Este tipo de comportamento torna-se particularmente perverso quando surge disfarçado sob a veste de fragilidade económica e de imposição pela conjuntura, utilizando a seu favor instrumentos jurídicos pensados para proteção contra erros e alterações imprevisíveis e confundindo sujeição com voluntariedade.
Um maior detalhe no conteúdo das obrigações contratuais e a inclusão no contrato de cláusulas de revisão automática, por exemplo do preço, ajudam a minorar o risco futuro de um comportamento oportunístico. Contudo, e reconhecendo as fragilidades do ordenamento jurídico em atuar de forma eficiente nesta temática, igualmente vantajosas no desincentivo ao oportunismo poderão ser a existência prévia de um histórico de relações comerciais bem-sucedidas entre as partes e a ameaça de perda da boa reputação comercial no mercado. Informar-se sobre e conhecer a contraparte têm, neste contexto, vantagens irrefutáveis.