João Pedro Martins, Jornal i,
Quando as doze badaladas assinalaram mais uma passagem de ano, milhões de pessoas em todo o mundo acreditaram que o novo ano seria melhor do que o anterior. Mas no dia seguinte, depois de acordar e regressar à normalidade, poucos se lembraram das promessas não cumpridas para mudar comportamentos sociais.
Desde que entrámos em 2013, sempre que adormeço e até ao último segundo antes de despertar, há um sonho que se repete e que me enche de esperança.
No meu sonho, o Estado é corajoso. Os políticos não dobram os joelhos perante os poderosos e a justiça é igual para ricos e para pobres.
No meu sonho não há governantes a comprar licenciaturas com o mesmo à vontade que se paga um café. Não há eleitores cobardes que se vendem por um micro-ondas e por promoções mercenárias, nem munícipes hipnotizados por Valentins e Isaltinos.
No meu sonho há um país onde defraudar o próximo ainda é violar um mandamento bíblico. O Estado não deixa prescrever as dívidas fiscais dos poderosos, nem rouba os carros e as casas dos contribuintes honestos que perderam os empregos e não podem pagar impostos imorais.
No meu sonho, a justiça não é cega e não há diretores regionais dos assuntos fiscais em funções depois de acusados pelo Ministério Público pela prática de crimes de evasão fiscal. Neste país em que gosto de viver depois de adormecer, os crimes de colarinho branco não são branqueados pelos melhores escritórios de advogados. Os criminosos coram de vergonha sempre que se cruzam com a sombra de um contribuinte que paga os seus impostos.
No meu sonho, a ética e as pessoas são mais importantes do que o dinheiro. Por isso, o Estado não se amedronta com os mercados financeiros, nem aplica medidas de austeridade extrema que sufocam as famílias e as pequenas empresas. Neste país maravilhoso não se oferecem benefícios fiscais e posições de monopólio às multinacionais. Nem há lugar para um Estado desmotivado e sem coragem para investir em serviços públicos de qualidade, na criação de empregos para os jovens e na garantia dos cuidados de saúde para os idosos. Neste país ninguém é convidado a emigrar.
No meu sonho há um presidente da República que todos os dias não deixa que se apague a chama de esperança para os desempregados e existe um primeiro-ministro que não se cansa em apostar na educação pública de excelência como contraprestação dos impostos pagos pelos contribuintes. Nesta democracia que mata as insónias há uma oposição política que não se limita a criticar, mas que procura soluções e discute propostas para o bem-estar de todos.
No meu sonho, a corrupção e a fraude são coisas do passado porque as leis não são feitas pelas minorias, nem para a privataria de lóbis obscuros. Não existe uma zona franca da Madeira, nem piratas fiscais que fumam charutos pagos pela exploração do trabalho dos pobres.
Nunca tenho dúvidas de que um dia o meu sonho se vai tornar realidade. A única dúvida que me persegue depois de acordar é saber se Portugal pode ser o país do meu sonho.
Temo que não!