João Pedro Martins, Jornal i,
A nível global há 32 biliões de dólares estacionados em paraísos fiscais. Este montante, que é equivalente a toda a riqueza a criar em Portugal nos próximos 135 anos, mina o comércio internacional e cria uma bola de neve de batota fiscal com consequências danosas para a economia mundial.
Na indústria offshore proliferam ninhos de corrupção porque se permite que uma elite corrupta que capturou a economia e o poder político possa fazer leis para benefício próprio, em prejuízo dos restantes concidadãos. Esta economia sombra é um viveiro do crime organizado onde padrinhos da máfia e barões da droga se misturam com políticos corruptos, empresários sem escrúpulos, estrelas do jet-set e multinacionais que deliberadamente ocultam fortunas para pagar menos impostos.
Na prática, a carga tributária está a ser transferida das grandes empresas para os pequenos contribuintes que, com os seus impostos, têm de alimentar o Estado para que exista dinheiro que seja aplicado na prestação de serviços públicos básicos.
Todos os anos, um bilião de euros evapora-se na economia global devido a práticas de corrupção. Só em África desaparecem 160 mil milhões dólares de impostos não pagos na origem que privam as populações locais de direitos humanos elementares.
Uma das técnicas usadas pelas multinacionais é o recurso à chamada “manipulação dos preços de transferência”. O offshore da Madeira é um bordel tributário especializado nesta arte de fuga aos impostos. As mercadorias nunca passam pelo porto do Funchal, enquanto artificialmente as faturas entram e saem inflacionadas nos registos contabilísticos das empresas-fantasma que as multinacionais criaram no paraíso fiscal português.
O facto de multinacionais concorrentes terem subsidiárias sediadas na mesma morada no Funchal constitui o cúmulo da batota fiscal. Poucos acreditam que numa sala de 100 metros quadrados possam existir mil empresas a funcionar. Mas oficialmente existem! A maior produtora do mundo de aço, a líder internacional da produção de alumínio ou a petrolífera estatal angolana, são alguns exemplos da georreferenciação da manipulação dos preços de transferência através do offshore da Madeira.
Uma técnica apurada para fugir aos impostos e usufruir de benefícios fiscais que estão vedados aos restantes contribuintes consiste em importar por 10 e vender por 100 através de transações intragrupo. O diferencial de 90 não paga impostos em Portugal, nem no país de origem nem no de destino. Este truque contabilístico que explora as fragilidades da lei portuguesa, mas que constitui uma violação do n.º 2 do artigo 38.º da Lei Geral Tributária, passa à margem da inexistente inspeção das Finanças e permite inflacionar artificialmente o PIB da região.
As consequências não podiam ser piores. Por ter um PIB per capita superior à média da União Europeia, a Madeira perde 500 milhões provenientes da UE e deixa de receber 400 milhões de euros previstos no Fundo de Coesão para as regiões ultraperiféricas.