Aurora Teixeira, Visão on line,

“It is nonsense to say that Germans are unable to change.” (Angela Merkel, chanceler alemã, n.1954-…)
Os alemães são frequentemente caracterizados como diligentes, óptimos construtores e inventores, mestres na organização, que prestam uma enorme atenção aos detalhes. Uma frase comum entre os alemães, "Wenn schon, denn schon", exemplifica o seu brioso carácter: “se algo tem de ser feito, então é preferível fazê-lo bem feito!” Ou seja, os alemães parecem nunca deixar as coisas a meio...
Mas estas coisas de estereótipos, ainda que utilizados, como aqui, no “bom sentido”, têm o que se lhes diga. De facto, já diz o ditado, “no melhor pano cai a nódoa”: Karl-Theodor Freiherr zu Guttenberg, um político germânico, com origens aristocráticas, em claro ascendente entre o eleitorado alemão e, até há pouco menos de um mês, ministro da defesa da Chanceler Merkel, foi apanhado nas “redes” da fraude académica.
Em Fevereiro de 2011 um jornal alemão noticiava que o ministro Guttenberg tinha inúmeras passagens da sua dissertação de doutoramento (concluída em 2007, com summa cum laude pela Faculdade de Direito, Administração e Economia da Universidade de Bayreuth, quando exercia o cargo de deputado) que careciam da correcta referenciação, em termos bibliográficos, aos autores originais – nas palavras de Andreas Fischer-Lescano, professor de Direito da Universidade de Bremen, a tese de doutoramento de Guttenberg constituiria "um plágio descarado". No dia seguinte a esta notícia outros órgãos de comunicação apresentavam mais passagens da tese, alegadamente, de “origem duvidosa”.
Guttenberg, que era considerado um potencial sucessor de Merkel, inicialmente refutou as acusações quer de plágio, quer de uso de ghostwriters (escritores-fantasma) da administração do Bundestag (Parlamento Alemão).
O ghostwriting é um tipo de fraude académica, com contornos ainda pouco estudados e clarificados, em que determinados indivíduos (os ghostwriters) escrevem textos “à medida” que são “oficialmente” creditados a um outro indivíduo que “paga” por estes serviços directa ou indirectamente, por via exercício de uma posição hierárquica superior (como, alegadamente, foi o caso de Guttenberg).
O apoio de Merkel a Guttenberg, argumentando que o teria nomeado para ser um ministro e não um assistente de investigação, irritou enormemente milhares de académicos e investigadores alemães que rapidamente efectuaram uma petição a nível nacional exigindo que a alegada quebra de integridade fosse devida e seriamente investigada e que Merkel retirasse o seu apoio ao ministro.
Não obstante negar que tinha cometido fraude de forma deliberada, Guttenberg, face ao crescente número de provas que emergia, admitiu ter incorrido em “erros graves”. Após processo de averiguações interno, em finais de Fevereiro de 2011, a Universidade de Bayreuth anunciou que retirava o grau de doutoramento ao ministro.
Em 1 de Março de 2011 Guttenberg renunciava ao seu cargo de ministro e, em 3 de Março, ao seu lugar no Parlamento.
Face à celeridade (após ser tornado público!) com que o processo de investigação decorreu na Universidade e ampla condenação pública, por parte dos cidadãos alemães, em geral, e dos académicos, em particular, relativamente à fraude cometida pelo ministro, pode-se afirmar que, de forma muito distinta dos nossos (portugueses) “brandos costumes”, onde a “culpa morre (sempre) solteira”, os alemães “exorcizam” (pelo menos) alguns dos seus fantasmas!