Pedro Santos Moura, Visão on line,

"Embora o número seja significativo em si mesmo [um custo de 30 biliões de libras com a fraude no Reino Unido, 2008], revelando inequivocamente que a fraude é um problema grave no Reino Unido, ele tem um significado mais amplo. Permite à comunidade que luta contra a fraude, orientados pela National Fraud Strategy, estabelecer adequadamente os seus objectivos no combate à fraude. Sinaliza tendências da fraude e seus pontos nevrálgicos, ao mesmo tempo que é uma referência para se medir o sucesso. Aquele número também alerta a indústria e o governo para a necessidade de investir os recursos adequados para combater um crime que afecta profundamente os sectores público e privado e os indivíduos" (Dr. Bernard Herdan, NFA Chief Executive, in NFA Annual Fraud Indicator 2010)
Na abordagem a problemas ou questões sérias, há diferenças fundamentais na atitude que seres humanos (ou entidades colectivas, como empresas ou estados) assumem. Fundamentais porque definem, a longo prazo, a capacidade obtenção de sucesso na resolução destes problemas e questões.
Destas diferenças, uma das mais influentes e marcantes é a capacidade de passagem efectiva da fase "política" para a fase "prática". Ou seja, da identificação e reconhecimento do problema e da sua gravidade, para a definição, execução e acompanhamento de planos concretos de acção. Em linguagem comum, o "passar das palavras aos actos".
Outra das principais diferenças de abordagem a matérias de importância é a capacidade de quantificar a dimensão quer do problema, quer dos resultados progressivamente atingidos. Mais uma vez trata-se de sair do campo das "ideias" ou "discurso político", para a arena concreta da "realidade".
Estes são, para mim, pensamentos de longa data, que vou recorrentemente observando e comprovando nas atitudes que nos rodeiam (e mesmo nas nossas).
Instanciando esta linha de raciocínio (portanto, saindo do plano das "ideias"), estes pensamentos voltaram ao meu teatro mental com a leitura de um relatório recente (Janeiro 2010) emitido pela National Fraud Authority (NFA) do Reino Unido [http://www.attorneygeneral.gov.uk/nfa/] , de seu título Annual Fraud Indicator [NFA Annual Fraud Indicator 2010]. Este relatório multi-sectorial é o resultado de um esforço concreto de combate e quantificação dos fenómenos de fraude.
Entre outros factos apresentados neste relatório, inclui-se uma estimativa do impacto financeiro total de fraude no Reino Unido: 30 Mil Milhões de Libras (cerca de 35 Mil Milhões de Euros), o que representa um custo, por cada habitante (homem, mulher, criança, pensionista, empregado, desempregado, etc.) de 621 Libras (cerca de 715€) por ano! Mais não seja, esta estimativa (porque é de uma estimativa que se trata) tem o condão de despertar governantes e governados para na necessidade da existência de uma abordagem séria, pragmática e actuante sobre este problema.
Por importante que possa ser (e é!) esta quantificação dos valores de fraude, a abordagem do Reino Unido à fraude é tudo menos uma declaração de intenções. Uma incursão breve pelo site do NFS, ou uma leitura do Annual Fraud Indicator permitem obter uma percepção da seriedade, profissionalismo e resultados alcançados neste país neste campo.
Reatando as ideias expostas no princípio deste texto, e comparando, por mero exemplo, a abordagem seguida no Reino Unido com a de Portugal, eu diria que há ainda por cá muito a fazer no que toca a "passar das palavras às acções" no que à fraude diz respeito. À unanimidade popular e dos responsáveis pelo estado e por empresas acerca do problema da fraude (mas quão grande o problema?), seguem-se geralmente declarações de intenção, promessas legislativas, implementação de programas de combate à fraude cujo principal fito é aparecerem citados em relatórios de contas, etc., etc. Todos estão de acordo com o problema, mas, muito "portuguesmente", na hora de arregaçar mangas e mudar de atitude, poucos têm a real vontade e capacidade de sair da sua esfera de conforto e participar efectivamente.
Embora pareça este último parágrafo um pouco negativo (há nele algo de desabafo, confesso), e pesando a enorme distância que ainda temos de atravessar para podermos chegar ao estado de maturidade no tratamento do problema da fraude em que, penso, todos gostaríamos de estar, tal não é nem impossível, nem impraticável. Quem quer realmente mudar acha nessa vontade a motivação para ultrapassar as barreiras pessoais e contextuais que os possam impedir.
E, no final de contas, quem sabe o significado do conceito Custo de Oportunidade (o que se perde por se ter feito uma opção), sente fortemente que ficar sentado à espera dos amanhãs que cantam não é propriamente a melhor decisão racional a tomar.
Concluindo, e mais concretamente, julgo que já seria altura de existir um esforço que parta do topo do estado e do tecido empresarial, no sentido de pensar, planear e actuar para combater o fenómeno de fraude. Não faria sentido a existência de uma NFA português? Felizmente o Observatório de Gestão e Economia de Fraude (OBEGEF) já existe, mas sem real poder actuante. Nem é esse o seu intuito e missão. Porque não passar concretamente da discussão legislativa em torno da corrupção (que penso ninguém realmente percebe muito bem de onde vem ou para onde vai.) para medidas mais concretas e eficazes? Mais uma vez sugiro uma leitura dos documentos que refiro neste texto, bem como uma vistoria sobre o que no Reino Unido se faz para combater a fraude. É matéria de interesse, e que deveria inspirar as entidades responsáveis no sentido da acção.