André Vieira Castro, Visão on line,

O lado paralelo da «Copa 2014», em que se agitam milhares de milhões.
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Pesquisando a internet por “Copa 2014”, percebe-se rapidamente que há uma realidade paralela que, mesmo agora que a bola já rola, consegue ter quase tanta força como a realidade desportiva.

Dispensemos, neste artigo, a agitação social brasileira, que também preenche essa realidade paralela, e atendamos apenas às componentes relacionadas com a fraude e a corrupção.

Comecemos por um exercício. Peguemos na classificação e pontuação dos 32 países (que participam no Mundial) atribuídas no Índice da Perceção da Corrupção em 2013, publicada pela Transparência Internacional (e disponível em http://cpi.transparency.org/cpi2013/results/#myAnchor1).

O índice atribui um “score” mais elevado aos países onde a perceção da corrupção é mais baixa, razão pela qual a Suíça é o 7º classificado no ranking e o país melhor colocado das 32 participantes do Mundial. Segue-se a Holanda e a Austrália. Não parece haver necessariamente uma correspondência entre transparência e potencial futebolístico. Falta saber se a proposição inversa se verificaria… isto é, se a falta de transparência de um país poderia promover o seu sucesso desportivo… bom, é melhor não verificar a proposição…

Portugal ocupa um aceitável 33º lugar, com 62 pontos. E é o 12º país presente no mundial com a classificação mais elevada.

As nações com pior perceção de corrupção no seu país (144 do ranking) e presentes neste Mundial são ex-aequo: Camarões, Irão e Nigéria.

Este exercício serve apenas para, com o pano de fundo motivacional do Mundial, levar o leitor a refletir sobre as diferentes nuances que envolvem e condicionam as performances de cada país, “dentro e fora das quatro linhas”…

Por curiosidade estatística, refira-se que o Grupo da Morte é neste caso o Grupo F, que obtém apenas 126 pontos (além de Irão e Nigéria, juntam-se Argentina e Bósnia, ambos com posições pouco meritórias no ranking). O segundo “pior” grupo é o A, com 149 pontos, mercê de juntar ao Brasil mais três países com fraquíssima performance anti-corrupção, como a Croácia (a melhor do grupo mas bem pior que Portugal), o México e Camarões.

No lado contrário, o melhor grupo é claramente o grupo B, com 294 pontos, fruto da junção de Holanda, Austrália, Chile e Espanha (por ordem de ranking). Destes, só a Espanha ocupa uma posição pior do que a portuguesa (e, a propósito, o grupo G, de Portugal, é o segundo grupo mais bem cotado).

Vejamos se a posição no ranking de corrupção tem alguma interferência no resultado final!

Passemos agora a refletir sobre alguns temas mais… “comezinhos”.

A construção dos estádios. Este é um tema que nos é familiar, embora felizmente só pela decisão política. Não tanto pelos inusitados problemas com a incerta natureza sobre o custo e o timing da construção dos diferentes estádios, que terão raízes não apenas assentes em erros de planeamento… com efeito, suspeitas há de que sucessivas trocas de empreiteiro, adjudicações diretas, subempreitadas ilegais, sobrepreço, custos extra, utilização de mão de obra ilegal, viciação de concursos, sonegação de propostas concorrentes, cartelização de concorrentes, … terão ocorrido e prejudicado em toda a linha quer o custo quer o timing da construção dos estádios quer das infraestruturas adjacentes.

Os negócios da fifa. De vários casos públicos, sobressai pela dimensão a escolha do país anfitrião do Mundial de 2022, a realizar-se (?) no Qatar. São já incontroláveis os boatos, as dicas, as informações contraditórias, as investigações, as suspeitas. Se houve suborno e corrupção na base da decisão da escolha, só há uma atitude a tomar, sem sopesar consequências. Repetir a votação, num quadro claro e transparente. O futebol aporta ilusão e esperança a milhares de milhões de pessoas, e tem uma responsabilidade superior de apelar ao jogo justo, ao respeito pelas regras e à sã competitividade. É intolerável que o governo da FIFA não pese o respeito pelos outros­ à frente de quaisquer outros valores. Ainda que não passem de meros boatos sem fundamento, a boa prática obriga a uma rápida, profunda e aberta dissecação do processo de escolha. Só a absoluta transparência permite um escrutínio avisado e impede a imposição de anátemas indevidos. Se os houvesse…

A Interpol investiga suspeitos de resultados combinados. Enviando equipa para o Brasil (mais uma equipa!) para investigar a probabilidade, tendo até já indícios de equipas mais vulneráveis a estas “combinações”…

Escolhemos apenas alguns apontamentos com o único propósito de fazer o leitor refletir.

No futebol, como noutras atividades, o glamour do espetáculo esconde (ou pode esconder, para ser preciso) uma complexa teia de interesses cuja manipulação é motivo suficiente para fazerem os fenómenos que tantas vezes são descritos aqui nesta coluna de opinião. E é para alertar para a nossa consciência e para que nos transportemos à realidade de cada país que entendemos, desta feita, chamar à sua atenção.

Evitamos habilmente falar de um fenómeno do futebol que, dizem-me, também sofre influências corruptivas… mas esse deixo ao critério do leitor descobri-lo e dissecá-lo-!

E … força PORTUGAL!