Manuel Abrantes, Jornal i online

As regras que são aplicáveis para atribuir um valor correto a bens e serviços não têm uma aplicação universal, existem determinadas mercadorias que, com objetivos sensacionalistas, têm uma valorização desfasada da realidade

A atribuição de um valor justo a bens e serviços foi desde sempre uma preocupação das entidades de regulação, em particular, mas também da generalidade dos cidadãos.

Numa economia de mercado, normalmente, o valor de bens e serviços é fixado segundo a regra da oferta e da procura.

No entanto, é sabido que deixar a fixação dos preços apenas à dinâmica do mercado, pode originar que estes tenham um valor desfasado da realidade económica e social.

Uma das soluções encontradas em muitos países para evitar o referido desfasamento é a criação de entidades reguladoras independentes que, entre outras, têm a função controlar a fixação de preços segundo critérios objetivos e com aderência à realidade económica e social.

Quando a fixação de preços está fora do controlo das referidas entidades, o poder político, por vezes, tem a tendência para os fixar abaixo do custo real para não subcarregar os consumidores. No entanto, esta prática facilita a vida dos consumidores, mas sobrecarrega os contribuintes.

Em alguns casos, os consumidores e os contribuintes coincidem, mas, quando não há coincidência, alguém fica prejudicado.

Nos países da União Europeia, quando o poder político fixa um preço abaixo do custo real, como por vezes sucede com a energia, é criado um défice tarifário, que é pago mais tarde pelos consumidores. Pois, segundo as regras comunitárias, estes défices não podem ser pagos pela generalidade dos contribuintes, mas apenas pelos consumidores em momento posterior ao da descida artificial do preço.

Por outro lado, quando estão em causa relações entre entidades privadas e o interesse é apenas comercial, não existem outros fatores que impeçam a fixação do preço segundo a regra da oferta e da procura.

Todavia, existem ainda situações em que, com propósitos sensacionalistas, não são respeitadas quaisquer regras de objetividade na divulgação do valor dos bens. É o que sucede quando se trata de anunciar o valor de algumas mercadorias que, devido a serem ilegais, permitem a utilização de qualquer critério.

Foi noticiado no passado mês de abril a apreensão de cocaína em águas de Cabo Verde, com a colaboração de autoridades norte americanas, no valor de 350 milhões de dólares.

A notícia nada dizia acerca do método de avaliação da mercadoria apreendida. No entanto, se fizermos uma busca sobre a forma como é obtido o valor dos estupefacientes apreendidos, chegamos à conclusão que estes são avaliados de uma forma maximalista: pelo preço que pagam os consumidores finais.

Quando estão envolvidas autoridades norte americanas na apreensão, o valor atribuído à mercadoria geralmente é o valor porque os estupefacientes são vendidos nas ruas de Nova Iorque. Este tipo de avaliação maximiza o valor da mercadoria, provavelmente para valorizar o trabalho das autoridades envolvidas na operação.

Contudo, falta-lhe rigor. Pois, as grandes apreensões de estupefacientes não são efetuadas nas ruas (quando é efetuada a venda aos consumidores), mas, sim, durante o trajeto que estes efetuam desde a produção até aos intermediários ou aos distribuidores.

Ou seja, quando a apreensão é efetuada ainda não está incorporada no preço da mercadoria toda a cadeia de valor. Porém, assistimos frequentemente a notícias bombásticas de apreensão de estupefacientes no valor de vários milhões de dólares (ou de euros), mas cujo valor atribuído não foi determinado com rigor.

Quando é atribuído o valor a estupefacientes apreendidos as regras são diferentes das que são utilizadas relativamente às restantes mercadorias. Por exemplo, se a um bovino adquirido num mercado em Santa Rosa (na província de La  Pampa, na argentina) for atribuído o valor da carne por ele fornecida aos preços praticados nos melhores restaurante de Nova Iorque, ninguém duvidaria que o seu valor estaria claramente inflacionado. No entanto, é isto que se passa quando são apreendidos estupefacientes.