Jorge Fonseca de Almeida, Jornal de Negócios

Nunca a frase de Júlio César “Também tu Brutus?” (“tu quoque, Brute?”) se aplicou tão bem a um historiador. Ruborizado senti intensa vergonha de ser compatriota desde Brutus barbado.

 

Os linchamentos eram uma forma violenta, cruel e desumana de assassinato seletivo ou vingativo de negros perpetrados por racistas brancos que ocorriam frequentemente no sul dos Estados Unidos como forma de manter a subjugação da comunidade negra camponesa que aí vivia. Qualquer negro que ousasse reclamar direitos iguais ou furar o apartheid rigorosamente estabelecido (lugares para brancos e lugares para negros) corria o risco de ser morto por linchamento. Estes atos bárbaros foram cometidos até depois da II Segunda Grande Guerra altura em que se começou a afirmar um movimento de direitos cívicos que alterou profundamente a situação nos Estados Unidos.Os tempos mudaram. Portugal é hoje uma democracia integrada numa União Europeia ainda ciente dos efeitos do racismo nazi que devastou países, levou à morte milhões de pessoas e por todo o lado deixou um traço de destruição. As tecnologias também mudaram. Vivemos na era do digital, das redes sociais, da omnipresença dos meios de comunicação social, das "fake news", da desinformação aberta, do insulto desabrido.
Depois das eleições de outubro até agora temos assistido a um verdadeiro linchamento mediático a Joacine katar Moreira.
Escandalizados por uma mulher negra ter sido eleita como cabeça de lista lançaram de imediato uma enorme campanha contra a deputada. Não tendo nada substantivo a apontar empolaram até ao absurdo o mais leve movimento, o mais breve dito descontextualizado, ou o pormenor mais insignificante. Nada tendo de substantivo a apontar passaram também a inventar (como a frase que já negou repetidamente "fui eleita sozinha"). Em todos os casos o método é simples empolar e não dar espaço de resposta. É a técnica moderna do linchamento político-mediático.
Foi triste ver o Livre participar neste processo de linchamento político-mediático, um partido extraparlamentar que sucessivamente se tem apresentado a eleições e falhado apesar da enorme exposição mediática do seu líder, ele próprio um antigo deputado europeu por um partido que abandonou mantendo o cargo. 
Um Partido que tudo teria a ganhar com a defesa de Joacine mas que escolhe desferir um golpe por trás quando ela está a ser atacada por outros lados. Nunca a frase de Júlio César "Também tu Brutus?" ("tu quoque, Brute?") se aplicou tão bem a um historiador. Ruborizado senti intensa vergonha de ser compatriota desde Brutus barbado.
Não fora Joacine Katar Moreira uma mulher forte, equilibrada e corajosa e teria já desistido. Exatamente o que os seus adversários querem.
Como as pessoas envolvidas em relações tóxicas se devem apartar e seguir separadamente, também Joacine deve reunir os seus amigos e apoiantes, que foram a parte substancial da força que a elegeu, e prosseguir o seu caminho. A legislatura ainda agora começou e há muito trabalho pela frente.
Muito longe das tricas políticas dos gabinetes, muito longe das intrigas jornalistas, há toda uma comunidade que a apoia e que precisa que ela os represente na Assembleia da República pugnando pelos seus interesses.

Economista