Aurora Teixeira, Visão online

... a desonestidade académica assume valores alarmantes entre os estudantes de enfermagem portugueses

Nos resultados de um recente inquérito de opinião (dezembro de 2018) realizado pela empresa Gallup, mais de quatro em cada cinco norte-americanos (84%) classificam a honestidade e os padrões éticos dos enfermeiros como “muito altos” ou “altos”, o que os coloca no primeiro lugar entre as 20 profissões consideradas (o último lugar do “ranking” é ocupado, sem surpresa, pelos políticos) (1). Também na Europa, e de acordo com inquéritos de opinião realizados pela empresa GfK Verein, a par dos bombeiros, os enfermeiros são considerados os profissionais mais confiáveis (2).

A moral, a ética e a honestidade constituem qualidades e características importantes para os profissionais de enfermagem já que são os enfermeiros os cuidadores de proximidade de muitos indivíduos durante alguns dos momentos mais vulneráveis das suas vidas. Assim, é muito preocupante a relação encontrada por alguns estudos científicos entre a falta de integridade académica no contexto de sala de aula dos estudantes de enfermagem e atos de comportamento desonesto na prática clínica (3).

Num inquérito à integridade académica dos estudantes do ensino superior em Portugal (4), implementado em 2015, foram obtidas 4028 respostas válidas, 120 das quais de estudantes de enfermagem e 420 de estudantes de medicina.

De acordo com os resultados deste inquérito, a desonestidade académica assume valores alarmantes entre os estudantes de enfermagem portugueses. Quase 80% admitiu ter copiado em exame (as percentagens homólogas para os estudantes de medicina e de outros cursos foram de 56% e 61%, respetivamente). Uma elevada percentagem [68%, muito superior à dos estudantes de medicina (47%) ou à dos estudantes dos restantes cursos (46%)] admitiu ter copiado respostas por um colega durante um exame, ter utilizado cábulas escritas para copiar durante um exame (45%, contra 14% dos estudantes de medicina), ou ter utilizado um telemóvel para obter ou trocar respostas durante um exame (24% face a 6% dos estudantes de medicina).

A incidência dos comportamentos tipificados como plágio, é também mais elevada entre os estudantes de enfermagem (superior a 80%), embora a diferença face aos de medicina e aos dos restantes cursos não seja tão acentuada quanto a da cópia em exame. O auto-plágio (reciclagem de trabalhos escritos) foi admitido por 44% dos estudantes de enfermagem inquiridos (35% dos de medicina e 39% dos restantes cursos), sendo que 15% admitiu ter mentido deliberadamente para conseguir entregar trabalho fora do prazo estipulado (nos estudantes de medicina esta percentagem era de 9%).

Se se considerar como válida a relação encontrada entre a falta de integridade académica no contexto de sala de aula e atos de comportamento desonesto na prática clínica, é caso para afirmar que serão demasiado elevadas, quiçá infundadas, as expectativas/confiança depositadas nos (futuros) profissionais de enfermagem em Portugal.

Notas:

(1) In https://news.gallup.com/poll/245597/nurses-again-outpace-professions-honesty-ethics.aspx.

(2) In https://www.gfk-verein.org/en/compact/focustopics/worldwide-ranking-trust-professions.

(3) Bultas, M.W., Schmuke, A.D., Davis, R.L., Palmer, J.L. (2017). Crossing the “line”: College students and academic integrity in nursing, Nurse Education Today, 56, pp. 57-62. Krueger, L. (2014). Academic dishonesty among nursing students. J. Nurs. Educ. 53 (2), 77–87.

(4) In https://obegef.pt/wordpress/?p=19416.