Tiago Sequeira, Visão online

É evidente a relação entre esta onda de eleições que levaram ao poder partidos de ideologia mais autocrática  e os movimentos eleitorais, referendários, ou militares que ocorreram no início do século XX.

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Torna-se inevitável associar a crescente eleição de governantes de extrema-direita em vários países da Europa, nos Estados Unidos e mais recentemente no Brasil aos ambientes de descrédito na democracia parlamentar e de elevada corrupção que existia em pelo menos alguns destes paises. A emergência de Bolsonaro como candidato presidencial e presidente do Brasil é disto exemplo paradigmático já que a democracia Brasileira tornou-se incapaz de resolver os problemas da corrupção (de que o caso Lava Jato é o exemplo mais marcante) e de segurança que afetam de forma dramática a população daquele país.

Quando se revisita a história do século XX torna-se evidente o paralelismo que existe entre esta onda de eleições que levaram ao poder partidos de ideologia mais autocrática (nacionalistas, adeptos do protecionismo comercial, contra a imigração, com discursos anti-corrupção e pró-securitários) e os movimentos eleitorais, referendários, ou militares que ocorreram no início do século XX e que levaram ao poder, por exemplo, os partidos Nazi na Alemanha e as ditaduras fascistas em Itália, Espanha e Portugal. Comum a estes períodos históricos antecederam outros em que a elevada corrupção estava presente. Basta para isso recordarmos o período da primeira república em Portugal, onde a instabilidade política e a corrupção eram aspetos marcantes. Nesta época, o país estava minado pela pequena corrupção e pela corrupção política e prevaleciam fenómenos de caciquismo e casos de grande corrupção que afetaram os caminhos de ferro, os tabacos, as obras no porto de Lisboa e o sistema financeiro.

Coloca-se uma questão que emerge desta simples análise histórica: será que a épocas de grande corrupção nas sociedades sucede a emergência de ideologias radicais no poder?

Muita da análise da história política baseia-se no estudo de casos de diferentes paises. Por exemplo, num artigo publicado no Journal of Law, Economics, and Organization, em 2014, James Hollyier e Leonard Wantchekon das Universidades de Minesota e Princeton nos EUA, defendem que os regimes autocráticos podem ou não incluir estruturas anti-corrupção. Quando os regimes não enfrentam uma forte oposição pela população, eles não constroem barreiras anti-corrupção porque pretendem que os seus apoiantes beneficiem das rendas associadas aos cargos de poder. Ao contrário, se e quando os regimes enfrentam uma grande oposição da população, então eles tendem a promover políticas anti corrupção de forma a evitar que os seus oponentes beneficiem das mesmas rendas. Neste sentido, não é sempre verdade que os governos autocráticos sejam mais eficazes a combater a corrupção. Mas uma resposta direta à questão que colocámos parece não estar disponível.

A questão subsequente é se o estado de direito tal como hoje o conhecemos é suficientemente robusto para impedir estes novos poderes de se transformarem em ditaduras seguindo o padrão que ocorreu durante o inicio do século XX. Só o tempo dirá como esta questão será respondida, embora o mesmo tempo nos deva ensinar que a resposta também depende do nível de desenvolvimento da transparência e dos sistemas de checks and balances em vigor nas democracias modernas.

Por exemplo a recente eleição intercalar nos EUA mostrou que numa sociedade como aquela, onde a população não demonstra um grande apoio ao presidente em exercício, a existência de eleições intercalares para as câmaras parlamentares pode ter um efeito-travão nas políticas de governantes de tendência autocrática e populista.

No entanto, a situação de paises onde a corrupção é um fenómeno mais preocupante, o apoio aos governantes de tendências radicais pode ser suficiente para os manter com poder decisório efetivo durante vários anos ou até décadas, como aconteceu no passado!