Jorge Fonseca de Almeida, Jornal de Negócios
Ter boas intenções é uma base mais sólida de partida, mas é insuficiente. Só percebendo as causalidades em presença e conhecendo o estado da situação no momento da nossa ação podemos juntar às corretas intenções a eficácia da ação.
Recentemente num jantar de velhos, em sentido literal, colegas de Liceu, um professor universitário, pensador heterodoxo e provocador, escritor de excecional qualidade, levantava o tema da frequente e, muitas vezes, paradoxal, desconexão entre as intenções pretendidas e os resultados obtidos.
Eis uma reflexão que me ocorreu no caminho para casa depois desse jantar que terminou a hora tardia.
A milenar sabedoria popular cunhou a expressão "de boas intenções está o Inferno cheio" e o utilitarismo de Jeremy Bentham e John Stuart Mill reconhecendo este problema proclamou, com muita razão, que uma ação deve ser julgada não pela intenção da pessoa que age, insondável até, por vezes, para o próprio, mas pelas repercussões que provoca.
"Foi com boa intenção" não chega para justificar uma ação de consequências nefastas, nem "agiu com ganância ou maus propósitos" mancha um ato com efeitos positivos.
Nesta perspetiva como devemos agir ao pretender agir bem, isto é, querendo que as nossas ações tenham resultados benéficos para o maior número?
Primeiro tendo sólidas boas intenções.
Na maior parte das vezes com más intenções obtêm-se maus resultados. Sem boas intenções só poderemos chegar a um bom resultado por via de uma externalidade inesperada ou por uma ação contraproducente. A externalidade inesperada do tipo da identificada por Bernard Mandeville na sua alegoria das abelhas e encapsulada na frase "vícios privados, públicas virtudes", tantas vezes mal interpretada, ou que Adam Smith associou a uma "Mão Invisível". As ações contraproducentes resultam de uma errada identificação da solução que depois conduz a um resultado diferente do planeado.
Ter boas intenções é uma base mais sólida de partida, mas é insuficiente. Só percebendo as causalidades em presença e conhecendo o estado da situação no momento da nossa ação podemos juntar às corretas intenções a eficácia da ação.
Se pretendo colocar uma bela jarra Ming num local em que seja desfrutada pelo maior número e não conheço as leis da gravidade, serei tentado a colocá-la no ar no meio da sala daí resultando a sua queda e, inexorável, destruição. É, pois, necessário conhecer as leis da causalidade que se aplicam na situação em que vamos agir.
Mas não chega. É preciso saber o estado da situação no momento de agir. Conhecendo a lei da gravidade colocarei a jarra Ming numa coluna que a possa sustentar. Mas se desconhecer que a coluna está deficiente, o desastre será igual.
Obviamente não é possível conhecer com detalhe todas as leis de causalidade em presença, nem averiguar o estado da situação de forma completa. A solução é então a prudente combinação da multiplicidade de ações, de aproximações sucessivas e de tentativa e erro. O que não impede de se poder concluir, quando não há outras soluções, que "para grandes males, grandes remédios".
A multiplicidade de ações permite conhecer melhor as leis em causa e o estado inicial da situação, as aproximações sucessivas ou pequenos passos permitem limitar as consequências negativas e a tentativa e erro permite tirar consequências da experiência e ir refinando a solução.
Em suma, agir bem assenta numa combinação de boas intenções, de mente aberta e de bom senso. Sem garantias.
Economista