Tiago Marcos, Jornal i
Terminadas as competições nacionais de futebol, importa analisar os tristes acontecimentos que marcaram esta época e que nada têm que ver com a prática desportiva desta modalidade.
Importa realçar que, na presente crónica, não pretendo abordar quaisquer suspeitas de corrupção que estejam em investigação, ou em julgamento pelas entidades competentes, o que não retira importância à cabal investigação que deve ser realizada a todas as suspeitas de irregularidades que, caso se confirmem, devem ser punidas. Na verdade, tenciono apenas analisar a forma como o comportamento de alguns agentes ligados ao futebol profissional (na minha opinião, pouco ético ou profissional) contribui para os referidos acontecimentos. Assim, nesta análise, proponho olharmos para a atuação dos clubes profissionais, da comunicação social especializada e dos órgãos reguladores da modalidade.
No que respeita aos clubes profissionais de futebol, e em especial aos seus dirigentes e treinadores, parece-me ser altamente irresponsável a forma como atuam, tal como:
- O facto de se ter tornado uma tática comum o desviar da atenção social dos falhanços desportivos de uma equipa, pela respetiva desculpabilização através de constantes críticas a equipas de arbitragens e aos demais clubes concorrentes (promovendo as suspeitas de corrupção generalizada, não investigadas, como dados consumados). Esta tendência tem escalado de tal forma que as críticas públicas já chegaram a focar publicamente os jogadores do próprio clube que tece as referidas críticas; ou,
- A manutenção de apoios financeiros e logísticos a grupos organizados de adeptos, ou a claques, muitas vezes associados a atividades criminosas e que são sensíveis a campanhas inflamatórias contra outros clubes. Este apoio é geralmente dado pelos clubes com a justificação que a presença destes grupos nos estádios anima o espetáculo desportivo, quando na realidade me parece que apenas afasta outros adeptos dos estádios, pela violência que frequentemente geram.
Assim, questiono se estas atitudes irresponsáveis deveriam ser publicitadas pela comunicação social e permitidas pelos órgãos reguladores do futebol e se, quando ocorrem, não deveriam ser severamente punidas?
No que respeita à comunicação social, e não me parecendo criticável o elevado tempo de antena atribuído ao futebol, pela sua popularidade junto da generalidade da população portuguesa, parece-me, por regra,ser altamente criticável a qualidade deste tempo de antena, já que:
- São focados até à exaustão temas altamente populistas e subjetivos, tal como a promoção de constantes críticas às arbitragens (pelos clubes e seus representantes nos órgãos de comunicação social), ou o tratamento de suspeitas de corrupção como dados consumados (muitas vezes em espaços supostamente noticiosos); e,
- Salvo raríssimas exceções, apenas são considerados como relevantes, pela comunicação social,os denominados 3 clubes grandes, desconsiderando e desrespeitando os restantes clubes, sendo que, na verdade,e sem que os demais clubes consigam ser competitivos, não me parece possível, ou sustentável, existirem clubes portugueses (ou mesmo a seleção nacional) a jogar continuadamente de uma forma competitiva nas competições internacionais. Para tal, considero apenas os factos de que as competições internas regulares são a forma de uma equipa manter o ritmo competitivo ao longo da época e de se poderem desenvolver os jogadores que não conseguem um lugar nos plantéis dos clubes grandes.
Logo, questiono se não têm estes órgãos o dever de informar de forma isenta? Questiono se não seria responsável que os órgãos de comunicação social revissem a sua atitude perante o desporto, de modo a promover positivamente o futebol e os seus protagonistas, não discriminando qualquer clube, em vez de promover a discórdia e a violência entre adeptos e para com as equipas de arbitragem?
Por fim, no que respeita aos órgãos reguladores do futebol (considerando a Federação Portuguesa de Futebol, a UEFA e mesmo a FIFA):
- Em especial face aos pontos anteriores, e atendendo a que uma das principais funções destas organizações é a de promover o futebol e a respetiva prática, deveriam proteger a integridade da modalidade e dos respetivos intervenientes, pelo que não me parece razoável que estejam meramente expectantes perante os tristes comportamentos que temos verificado;
- Adicionalmente, e considerando a violência que tem sido visível, em especial perante as equipas de arbitragem (fruto dos comportamentos referenciados), não me parece razoável que estes órgãos não obriguem a que as críticas dos clubes (em especial a equipas de arbitragem) sejam devidamente tratadas nos bastidores, e não na praça pública, de modo a proteger a integridade física e moral de todos os envolvidos;
- Parece-me ainda importante referir que as regras impostas por estes órgãos, tal como as supostas regras de fair play financeiro, que também me parecem não fazer sentido, já que parecem favorecer injustiças e os clubes grandes. Por exemplo, um clube pode ser penalizado por investir demasiado na aquisição de passes de jogadores, não sendo penalizado um outro clube que tenha sido alvo de um perdão de dívida bancária (cumprindo as ditas regras por este motivo).
Assim, julgo ser claro que a atual má imagem do futebol profissional é fruto direto de comportamentos não éticos e desregulados que são promovidos pelos respetivos intervenientes. Neste sentido, parece-me que o impacto desta situação na sociedade é relevante,pela publicidade que lhes é atribuída (fruto da popularidade deste desporto), o que pode acabar por normalizar comportamentos não éticos que incentivam a violência e o desrespeito entre adeptos e para com equipas de arbitragem.
Deste modo, questiono se, para o bem do futuro deste desporto, das pessoas que o acompanham e da sociedade em geral, não deveria existir uma regulamentação ativa dos comportamentos permitidos e a punição dos comportamentos desviantes? Não estará na hora de nos focarmos na prática do futebol?