Edgar Pimenta, Visão online

Um agradecimento à Mariana Mortágua que na sua apresentação do livro “Os offshores do nosso quotidiano” de Carlos Pimenta, me deu a ideia desta crónica.l.

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1: Esta é uma pergunta que pode parecer algo ridícula à primeira vista mas será que o é mesmo?

Um dos objetivos dos offshores, seja na sua génese de criação, seja na sua utilização mais comum é o de permitir a circulação de fluxos monetários de forma não rastreável. Como o setor bancário é (ou devia ser) por natureza capaz de rastrear a origem e destino do dinheiro, apenas é possível fugir a esse rastreamento através da utilização dos offshores.

A bitcoin, Ethereum e outras criptomoedas têm como característica comum na sua criação o facto de não serem rastreáveis. Ou seja, criptomoedas e offshores têm o ponto comum da não rastreabilidade.

2: E porque se pretende esta não rastreabilidade? Afinal, quem não deve, não teme. A resposta a esta pergunta está noutra pergunta: qual a origem do dinheiro colocado nos offshores?

Estima-se que dos 26,5 biliões de dólares registados nos offshores a parcela maior tenha origem em atividades ilegais tais como o tráfico de droga, armas, pessoas e o consequente branqueamento de capitais (vulgo lavagem de dinheiro) ou em crimes «menores» tais como a fuga ao fisco . Ou seja, o dinheiro que alimenta os offshores é muitas vezes, de origem dúbia.

E qual a principal utilização que foi dada (e ainda será) às bitcoins? Transações sobre o mesmo tipos de bens (drogas, armas, etc…) na chamada deep web. Ou resgates associado ao cibercrime, como é o caso dos famosos ransomware.

Algo infelizmente comum entre as bitcoins e os offshores.

3: Um terceiro ponto comum é a demagogia do controlo, embora aí por razões algo diferentes. Os offshores são algo que se tem vindo a tentar regular e/ou banir. Mas essa vontade dita não se traduz em ação prática, provavelmente por falta de querer político e por muitos outros interesses escondidos. Basta pensar quem ganha com os offshores? Não será com certeza o cidadão comum (esse até perde, indiretamente, resultante de fuga ao fisco, da corrupção e do crime).

O mesmo se passa em parte com as criptomoedas. Fala-se da necessidade de regulação, de maior controlo mas na prática nada é feito. Mas aqui poderá não ser pela falta de vontade política ou interesses instalados mas sim por real dificuldade de controlar algo que nasceu para não ser controlado. Provavelmente, as mesmas instituições que controlam os offshores seriam as instituições que gostariam de colocar controlo sobre as criptomoedas. Afinal, poderá ser concorrência. Ou será um mercado diferente?

4: Existem semelhanças mas existem também igualmente diferenças interessantes.

Os offshores são acessíveis apenas a uma elite. As criptomoedas não. As criptomoedas são das massas. Ou seja, a capacidade de esconder dinheiro chega ao comum mortal, embora muitos vejam atualmente as criptomoedas sobretudo como mais uma forma de rapidamente chegar ao clube dos milionários. (Tenderia a dizer que o mundo em breve se dividirá entre os que acham que a bitcoin só tem um caminho - para cima - e os que achas que a bitcoin é uma bolha. É também a diferença entre os que têm dinheiro investido em bitcoins e os que não tem).

E existe obviamente uma diferença fundamental: os offshores são instituições e as bitcoins são… dinheiro? Um ativo? Bem… São algo que tem valor intrínseco em si mesmo, ainda que neste momento valor meramente especulativo.

E quem usa offshores pretende salvaguardar o seu dinheiro, algo que poderá não ser totalmente verdade quando se investe (porque neste momento é apenas isso - um investimento) em criptomoedas.

5: Mas fica uma questão para reflexão: e se o valor das criptomoedas não fosse especulativo e fosse mais estável? Não seria uma excelente alternativa aos offshores?

O tempo (como de costume) dirá…