PARTICIPAÇÃO DO OBEGEF EM REUNIÃO COM O UNODC (United Nations Office on Drugs and Crime)

28 de Fevereiro de 2018

Participação: Rute Serra


Através da Resolução da Assembleia da República, n.º 47/2007, de 21 de setembro, Portugal aprovou a Convenção contra a Corrupção, adotada pela Assembleia Geral das Nações Unidas, em 31 de outubro de 2003.

De modo a garantir a conformidade da atuação do Estados Partes, com as regras da Convenção, em 2010, a UNODC (United Nations Office on Drugs and Crime), procedeu ao primeiro ciclo de avaliação da Convenção, dedicado aos capítulos da Criminalização, Forças de Segurança e Cooperação Internacional. O segundo ciclo de avaliação ocorreu em 2015, e incidiu sobre as áreas de Medidas Preventivas e Recuperação de Ativos.

Decorre presentemente o terceiro ciclo de revisão da Convenção. De acordo com os termos de referência do Mecanismo de Revisão, cada Estado Parte é revisto por pares de dois Estados. O modo como Portugal está a aplicar a Convenção, está a ser revisto por representantes dos Estados da Noruega e da Croácia.

O OBEGEF foi chamado, enquanto entidade da sociedade civil, a pronunciar-se especificamente sobre a aplicação do artigo 13º da Convenção (sob a epígrafe “Participação da Sociedade”) e, na generalidade, sobre a aplicação dos restantes artigos que compõem aquele instrumento.

Enquanto membro da Direção, a signatária procedeu no dia 28 de fevereiro à representação do Observatório, na reunião de revisão que teve lugar nas instalações da Direção-Geral de Política de Justiça, em Lisboa, ponto focal com as Nações Unidas, para o efeito.

Após uma apresentação sintética sobre os objetivos de constituição do Observatório, em 2008, procedemos à explicação sobre seis “produtos” do OBEGEF, que considerámos de maior relevância, para melhor compreensão acerca da atividade prosseguida. E que foram (sem ordem específica): A elaboração do primeiro livro, em Portugal, dedicado exclusivamente à temática da Fraude, enquanto fenómeno criminológico e jurídico, as Conferências I2FC, a publicação regular, de  crónicas dedicadas à temática da fraude, em órgãos de comunicação social, a publicação de artigos científicos, disponíveis integralmente no website do Observatório, o estabelecimento de Protocolos com entidades públicas e privadas, com vista à realização de formação, inicial e contínua, e a publicação do Índice de Perceção de Fraude em Portugal (IPF2017).

Este último “produto” suscitou o interesse generalizado dos representantes presentes, em especial do elemento da Noruega, que questionou a signatária em detalhe sobre o assunto. Foram fornecidas algumas conclusões do IPF2017, tendo assumido o compromisso de enviar as conclusões daquele estudo, traduzidas em inglês, ao elemento Anders Worren. Julgamos que, deste modo, foi útil e profícua a projeção internacional, do IPF, desenvolvido pelo Observatório.

De seguida, contextualizou-se o termo “fraude”, na conceção nacional, visto não corresponder, ao arrepio do que sucede noutros ordenamento jurídicos, a um tipo-de-ilícito específico, mas antes a um fenómeno criminológico, pelo que o seu estudo, pelo Observatório, incide não só na vertente jurídico-criminalizante, mas também nas várias consequências, perceções e medidas preventivas que o fenómeno encerra.

Suscitado o interesse dos presentes acerca do modo de financiamento do Observatório, foi esclarecido que este não dispõe de receitas provenientes de instâncias governamentais, o que seria inclusive indesejável, porque eventualmente comprometedor da isenção e imparcialidade das análises e atividade que realiza e ainda que o seu financiamento se deve, em exclusivo, a receitas geradas de modo próprio, nomeadamente donativos dos sócios.

Relativamente ao artigo 13º da Convenção, a signatária acrescentou que no âmbito do Decreto-Lei nº 274/2009 de 02 de outubro, o Observatório foi, em duas ocasiões, consultado diretamente pelo Parlamento, sobre iniciativas legislativas relacionadas com a temática da fraude (novembro de 2016). Em 2010, havia sido auscultado na Comissão sobre a Corrupção, também naquela instância. Em termos internacionais, em 2016 o OBEGEF participou numa reunião com uma missão da União Europeia, para avaliação da adoção das recomendações de política económica. Porém, considerámos que, face à prolixa produção legislativa que direta ou indiretamente incide sobre a problemática da corrupção, em sentido genérico, o OBEGEF teria condições de aportar uma mais-valia relevante, em momento ex ante à publicação dos diplomas legais e até da efetivação de políticas públicas relacionadas com esta problemática, porém, tal não ocorre com a frequência desejada.

Neste momento, pela representante do Secretariado das Nações Unidas foi sugerido que o Observatório procedesse à agremiação com outras entidades nacionais congéneres, ao que a signatária elucidou que o objeto e atividade prosseguidos, são únicos no panorama nacional, o que dificultaria este género de associação.

De seguida, o enfoque da reunião centrou-se nas afirmações da signatária, sobre a eficiência e eficácia da aplicação, por Portugal, dos restantes termos da Convenção, de acordo com a perceção do Observatório. Foram apresentados determinados pontos, elencando, de seguida, aqueles que suscitaram maior interesse, e outros, sobre os quais os representantes decidiram questionar a signatária:

  1. A necessidade de Portugal desenvolver uma estratégia integrada de prevenção e combate à corrupção (de acordo com as recorrentes recomendações internacionais), que envolva todos os stakeholders que “trabalhem” estas matérias, seja no plano judicial, legislativo ou mesmo civil. Foi explicado que, mais importante que manter o ritmo, até aqui cadente, de produção legislativa sobre corrupção, é que exista um pensamento coerente e integrado que evite desperdício de recursos e promova uma construção sólida, com ganhos certos de eficácia (quer na prevenção, quer no combate), da corrupção em Portugal. Por outro lado, foram ainda elucidados os presentes, que tão importante quanto a elaboração daquela estratégia, é a comunicação do acervo existente, aos cidadãos em geral (numa lógica de educação cívica) e aos técnicos que trabalham nesta área, em específico. Por fim, pela signatária foi afirmado que a eficácia das medidas existentes em Portugal, de proteção, por exemplo, de denunciantes de atos corruptivos, é frágil, enunciando-se exemplo;
  2. Discussão sobre a problemática da corrupção na classe judicial. Pela signatária foram fornecidas algumas explicações sobre a perceção da sociedade portuguesa, relativamente a esta temática;
  3. Sugeriu-se que a figura do segredo de justiça fosse reequacionada, face às constantes fugas e ainda porque sempre que estas ocorrem provavelmente na sua base está o cometimento de atos corruptivos;
  4. Abordou-se ainda o tema da eficácia do procedimento de declarações de rendimentos de políticos e titulares de altos cargos públicos. O interesse nesta matéria (nomeadamente sobre a eficácia do processo), foi relevante, pelo que, a determinado momento, a signatária optou por remeter mais esclarecimentos para a entidade própria, a saber, o Tribunal Constitucional (entidade que vai ainda se ouvida no âmbito desta revisão);
  5. Tratou-se ainda o tema dos conflitos de interesses na classe política, da regulação da atividade de lóbi e da transparência no acesso ao funcionalismo público e a altos cargos dirigentes da Administração Pública, tendo a signatária provido detalhes sobre essas temáticas.

As conclusões do Relatório da UNODC ficarão disponíveis no site daquela entidade, sendo possível aceder à integralidade do Relatório, a pedido.