Ana Clara Borrego, Jornal i online

Uma das maiores preocupações das agendas, a nível mundial, é o ambiente, mormente a economia circular; principalmente, porque, começam a ser, cada vez mais, visíveis (e mais “palpáveis”) as consequências nefastas das alterações climatéricas.

Nesta fase do ano em que proliferam as formações sobre o Orçamento de Estado de 2018 e na qual, ainda, muito se discute sobre as consequências da sua aplicação, era quase inevitável não escrever sobre este tema. Todavia, como sabem os que acompanham as minhas crónicas, não gosto de escrever sobre temas já amplamente comentados e noticiados sem lhes acrescentar nada de novo.

Assim, à semelhança do que aconteceu na minha crónica anterior (já sobre o OE de 2018), vou pegar neste tema numa perspectiva totalmente diferente do habitual. Não me vou referir a pormenores técnicos, à sua complexidade ou carga fiscal, mas referir-me a ele no contexto da política fiscal em Portugal.

Um dos motivos que me induz a escrever, frequentemente, sobre a necessidade de simplificação fiscal versus a sua excessiva complexidade, prende-se com a minha convicção de que os sistemas fiscais devem evoluir, mas numa perspectiva positiva, isto é, em prol da sociedade e não contra ela. Nessa mesma linha de pensamentos, os sistemas fiscais também devem modernizar-se, ou seja, devem acompanhar a sociedade naquilo que são as suas preocupações e necessidade mais emergentes.

É inequívoco que, neste momento, uma das maiores preocupações das agendas, a nível mundial, é o ambiente, mormente a economia circular; principalmente, porque, começam a ser, cada vez mais, visíveis (e mais “palpáveis”) as consequências nefastas das alterações climatéricas. Começa a haver, cada vez mais, noção de que os recursos naturais não são ilimitados e da nossa excessiva pegada ambiental.

Neste ponto os leitores estarão certamente a questionar-se sobre como estará tudo isto relacionado com a fiscalidade, o sistema fiscal e o OE de 2018?

Para que os leitores compreendam o alcance desta relação começo por vos dizer que a fiscalidade é uma arma! Ou uma ferramenta, para utilizar um termo mais ‘suave’, cujo principal objectivo é, inequivocamente, a arrecadação de receita fiscal, mas que pode ser utilizada, também, para induzir os cidadãos-contribuintes a mudarem determinados comportamentos para obter um benefício fiscal, ou evitar a aplicação de uma taxa de imposto mais elevada.

Quantos sistemas de energia solar não foram colocados nas habitações para obter o benefício fiscal correspondente? Quantas viaturas antigas não foram para abate para obter o benefício inerente ao abate de viaturas em fim de vida? E mais recentemente, quantos de nós – pois também aqui me incluo – deixaram de trazer os tradicionais sacos de supermercado, para evitarem o pagamento da taxa ecológica sobre os sacos de plástico leves?

A este uso da fiscalidade para provocar comportamentos ambientalmente mais responsáveis nos contribuintes denomina-se por fiscalidade ambiental. A fiscalidade ambiental começou a ser utilizada, desde a década de 90 do século XX, primeiro nos países nórdicos e depois, ao longo dos anos, generalizou-se, com maior ou menor peso nos sistemas fiscais.
A maioria dos leitores provavelmente nunca tinha pensado nestas questões nesta perspectiva, o que é compreensível. O que já não é aceitável é que aqueles que idealizam e concebem a nossa política fiscal se esqueçam, frequentemente, que a fiscalidade ambiental é uma ferramenta em prol das políticas ambientais, a qual, em muitos países tem gerado, para além dos ganhos ambientais, receita suficiente para desagravar aquilo que denominamos por tributação tradicional (por exemplo a tributação sobre o trabalho – IRS e segurança social).

Portugal não deixa de ter nos códigos fiscais alguns pequenos ‘apontamentos’ de fiscalidade ambiental (também conhecida por fiscalidade verde), contudo não passa disso mesmo, de umas quantas normas dispersas sem grande conexão entre si. Em 2015 foi aprovado o diploma da Fiscalidade Verde, o qual não alterou este panorama.

O OE de 2018 é um exemplo paradigmático desse esquecimento, pois, pese embora seja atribuído no OE uma grande relevância às questões de caracter ambiental, concretamente na sua nota síntese do denominado “Programa Ambiente”, o qual, focando-se nos princípios da Economia Circular, se divide em sete grandes eixos de actuação: ‘descarbonizar’, ‘partilhar’, ‘habitar’, ‘sustentar’, ‘circular,’ ‘valorizar’ e ‘eliminar’, consubstanciando-se num programa ambicioso nas linhas que traça, mas para o qual não existem medidas de concretização com o mesmo nível de ambição e que possibilitem alcançar aquele conjunto de metas traçadas. Isto é, traçou-se um plano ambicioso a nível das metas ambientais, sem fazer uso, na mesma proporção, daquela que, na minha opinião, é a principal ferramenta para o conseguir alcançar: a fiscalidade ambiental.

É certo que o objectivo que se almeja alcançar é a mudança da mentalidade das pessoas. Contudo esse tipo de mudanças pode demorar gerações a ocorrer. Por isso, e até que elas sucedam, é necessário fazer uso de outro tipo de ferramentas que permitam, no curto e médio prazo, alcançar os mesmos objectivos.