Henrique Santos, Visão online,

 

“Os afilhados andavam felizes, devem ter recebido uma notinha dos padrinhos

Meu caro Diário,

Passei o Domingo de Páscoa inteiramente dedicado à família e a Deus, na esperança que, quando escrevesse esta crónica, finalmente não tivesse motivo para escrever sobre a Fraude.

Fiz de propósito, para testar o poder que a fraude tinha sobre mim e sobre o meu dia.

No momento que estou a escrever, já passa das zero horas do dia 17 de abril de 2017.

No dia de Páscoa não vi televisão, não li jornais e não consultei a Internet como é hábito fazer. Absolutamente nenhuma fonte de informação.

No início não adiantou! Lá andava ela a martelar-me a cabeça, a maldita Fraude. Para onde olhava lá estava ela, parece que me sorria a todo o instante. Danada!

Voltei a fazer “orelhas moucas”. Desliguei por completo. Vou conseguir, pensei.

Fui bem cedo à missa dominical. À saída, os voluntários que haviam de levar o Senhor até nós, já se encontravam reunidos.

Voltei de carro a casa, de onde não haveria mais de sair durante o dia, dado que tive a sorte de ser a maioria da família que havia de se juntar a nós.

Comecei por ajudar na preparação da receção à família e ao Senhor (este só haveria de chegar ao fim da tarde, como era hábito). Todos os que ajudaram eram da família e não houve ajuda externa de qualquer “empregado”.

A azáfama (muito agradável, note-se) estava instalada. Foi o meu Pai que comprou o cabrito no talho, e também o assou (se o quis comer), o leitão simplesmente apareceu, sei eu lá de onde (foi uma tia que o trouxe, mas acho que foi oferecido por outro). A minha prima apareceu com quatro garrafas de vinho e um bolo caseiro de laranja, outra tia com mais um pão-de-ló (isto sem contar com os que já tínhamos em casa). Pode dizer-se mesmo que houve uma invasão de pão-de-ló lá por casa. A água da nascente lá da aldeia também não faltou.

Também fizemos ovos recheados. Os ovos foram comprados no mercado municipal, assim como alguma hortaliça e fruta. As batatas, essas, eram da horta dos meus pais.

No que ao chocolate diz respeito, até uns ovos da Páscoa chegaram, trazidos na bagagem do avião de um país sul americano. Impensável, chegarem direitinhos sem se partirem ou deteriorarem. Eu também comprei ovos de chocolate para oferecer (mas comprei-os cá).

A nossa vizinha veio pedir-nos laranjas que precisava para juntar ao alecrim como era hábito na visita pascal. Outra vizinha foi brindada com um bolo preparado pela minha mãe. Esta aproveitou para falar da viagem de finalistas do filho, e que este havia regressado na quarta-feira (nem imaginam o que esta lhe contou, desde a organização da agência de viagem, passando pela estadia no hotel e terminando no regresso a casa).

Os afilhados andavam felizes, devem ter recebido uma notinha dos padrinhos.

A acompanhar o café, o vinho do Porto do Pai de um meu amigo (também presente), e a aguardente que outro familiar havia oferecido, foram a cereja no topo do bolo. Já sabes como são estas bebidas, não sabes?

À mesa os assuntos eram diversos e discutidos com animação. Os mais novos falavam de computadores, de acessos a aplicações via internet com IP espanhol (nós passamos a Páscoa em Portugal), e assuntos deste género. Os mais velhos falavam dos novos “pacotes” de telefone com tudo incluído (mas que só usam telefone e TV), das oficinas de automóveis mais em conta, das novas notas de 50 euros que entraram em circulação e por aí fora. Havia ainda uma franja de comensais que, sendo professores em diferentes países e, inclusive, em continentes distintos, discutiam questões de conteúdos programáticos, quem os definia, quais os tempos letivos a eles dedicados, e por aí adiante.

Nem te conto o que aconteceu no lanche e jantar do dia de Páscoa, mas já deves imaginar que a festa continuou. Sabes como é esta família, não sabes? O pior mesmo foi quando parte da família teve de regressar a casa. Ficou a esperança de um rápido regresso.

Meu querido diário, acho que consegui passar um dia sem fraude. Amanhã atualizo-me com as notícias vindas a público e depois conto-te tudo.

Penso que sobrevivi...

Antes de me despedir de ti, li o que escrevi. Fiz mal, acho que ela voltou. Ressuscitei!