Rute Serra, Jornal i online

Portugal beneficiará até 2020 de 25 mil milhões de euros, provenientes do acordo de parceria firmado com a Comissão Europeia, denominado Portugal 2020

Equilibrar os objetivos das políticas de inclusão social e emprego e os manifestados pela lógica empresarial, nem sempre se revela tarefa simples.

Se de um lado assistimos à premente e absoluta necessidade de encetar políticas eficazes de emprego, sejam elas inovadoras ou decalcadas das recomendações europeias, do outro estacamos nas conveniências assentidas pelas entidades empregadoras, as quais, como é sabido, gizam a maximização do lucro.

Até aqui, o problema situa-se na esfera própria da dificuldade de compatibilização de interesses, em abstrato, antagónicos. Complica-se contudo o caso, quando uma das partes subverte, através da prática delituosa, esse pretenso equilíbrio.

Portugal beneficiará até 2020 de 25 mil milhões de euros, provenientes do acordo de parceria firmado com a Comissão Europeia, denominado Portugal 2020, que reúne a atuação de cinco fundos europeus estruturais e de investimento, no qual se definem os princípios de programação que consagram a política de desenvolvimento económico, social e territorial, alinhados com a Estratégia Europa 2020. Um dos domínios temáticos do investimento é precisamente a inclusão social e emprego. Dentro deste contexto, as empresas, na qualidade de beneficiárias, deverão estar adstritas a uma política gestionária responsável, que permita garantir a integridade dos dinheiros públicos envolvidos.

Contudo, de entre uma miríade de comportamentos ilícitos perpetráveis pelas empresas, com relação ao recebimento daqueles subsídios, destacamos o crime de fraude na obtenção de subsídio ou subvenção, previsto e punido no artigo 36º do Decreto-Lei nº 28/84 de 20 de janeiro, considerado um crime de execução vinculada, ou seja, trata-se de um crime que se prolonga no tempo e cuja esfera de proteção da norma não se cinge ao momento inicial.

De 2007 a 2015, foram registados em Portugal 74 inquéritos por indícios deste crime. Este delito criminal, ínsito no direito penal secundário, visa proteger bens jurídicos supra-individuais, correspondentes aos referentes teleológicos da política económica pré-determinada à concessão de incentivos, e caracterizados materialmente pela sua relevância direta para a ordem económica, cujo funcionamento eficiente se pretende assegurar: desde logo, o património público.

Temos, deste modo, previsto, no essencial, o bem jurídico a tutelar: não só a confiança na vida económica, mas também na correta aplicação dos dinheiros públicos, no domínio da economia. Para que tal não esmoreça, importa garantir a que a dotação das entidades fiscalizadoras é suficientemente adequada.

Do preâmbulo do diploma, onde se encontra tipificado aquele crime, constatamos a “necessidade de proteger o interesse da correta aplicação de dinheiros públicos nas atividades produtivas”. Com efeito, e de acordo com a jurisprudência fixada pelo Supremo Tribunal de Justiça em 2006 (Acórdão do STJ nº 2/2006), a consumação do crime ocorre com a disponibilização ou entrega do subsídio ou subvenção ao agente, na aceção prevista no artigo 21º daquele diploma: (“a prestação feita a empresa ou unidade produtiva […] 2). Por outro lado, o quantum do subsídio ou subvenção – se se tratar de “montante consideravelmente elevado” - constitui agravante modificativa, fazendo concluir que o recebimento ou disponibilidade direta do valor é elemento constitutivo do crime, fundamental portanto, para a sua consumação.

Acresce à pena aplicável pelo cometimento deste crime, o disposto no artigo 39º, do mesmo diploma legal, que determina a condenação paralela do agente, na reposição das quantias ilicitamente obtidas.

Façamos pois votos, para que os benefícios resultantes da execução criminosa, não suplantem os custos advindos da aplicação das sanções penais, aos seus autores.