José Leal, Jornal i online
O homem que se faz detonar como se de uma bomba se tratasse, exprime um profundo desprezo pela vida e por si próprio. É um morto-vivo, ou um zumbi em vida, que acredita que sacrificando o corpo pela alma se pode salvar, e que dessa forma poderá contribuir para um futuro que rigorosamente já não lhe pertencerá.
O terrorismo de inspiração religiosa que assola o mundo Ocidental representa uma das repercussões do modelo de desenvolvimento arquitetado pelo próprio Ocidente durante as últimas décadas do seculo XX, com continuidade pelo novo milénio, fundado na exploração económica de determinados países e na ingerência política sobre Estados sobre os quais existem interesses a salvaguardar. Gerou-se pois uma vaga de choque civilizacional, que se abateu sobre o próprio egocentrismo Ocidental.
Assimetrias e desequilíbrios despoletados por processos de desenvolvimento socioeconómico impulsionados e patrocinados por interesses democratas e laicos. O lado negro da democracia encontramo-lo dominado por um capitalismo desregulado, numa espiral de progressão geométrica, de dinheiro pelo dinheiro; de poder pelo poder.
Em resposta à opressão politica, social e económica, a pobreza e o deficit de esclarecimento, a irracionalidade, e a capacidade de comunicação e de (des)informação nas redes sociais, encontramo-la na fragilidade da condição humana, dominada pela falta de esperança, pelo desespero, pelo medo, pela proposta de solução através do atroz, do horror pelo terror.
Destemperança e crença no ódio pelo outro materializam-se na mente como fundamentos racionais e argumentos válidos para que no digladio da arena da consciência e da alma, o amor e a solidariedade cedam à investida do ódio e da anulação do outro.
É por entre as decisões de luxuria, avidez, e egoísmo que se ergue o desprezo pela vida e pela alegria de se estar vivo. É por entre as curvas apertadas do caminho da nossa sociabilidade, das diferenças e similitudes, e desequilíbrios, que tropeçamos na fraude de pensar que podemos dar o corpo pela alma.
O homem-bomba acredita que sacrificando o corpo pela alma se pode salvar, e que dessa forma poderá contribuir para um futuro que rigorosamente já não lhe pertencerá; julga pois, que o preço a pagar – a sua vida, e a dos cordeiros de Deus, esses sim anjos do estranho designo de outros, de estranhas certezas em precipício – poderá redimir a causa santa que apenas faz sentido na loucura do descontrolo e do profundo medo pelo Ocidente, e na verdade, consequência dos erros maléficos que o Ocidente tem produzido sobre determinados quadrantes do mundo.
Todavia, a razão, e esse atributo tão bem distribuído (!) pela humanidade – o bom senso – aconselha-nos a não cedermos o corpo pela alma, pois serão certamente dimensões distintas do ser, e do dever ser; no fundo, referimo-nos a tangibilidades da mente e da ação, e da estranha redenção de um suposto mundo, fundada no sofrimento e no assassinato.