Manuel Carlos Nogueira, Visão online,

 

É possível acabar de vez com este flagelo que é a corrupção? Será que as recentes alterações normativas podem contribuir significativamente para esse objectivo? Qual a actuação de cada um de nós?

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No passado mês de Abril efetuou-se mais um contributo para a repressão da corrupção e crimes adjacentes, nomeadamente no alargamento da responsabilidade das pessoas coletivas e entidades equiparadas aos crimes de peculato e de peculato de uso, incluindo as empresas propriedade do Estado e por este controladas, para poderem ser criminalmente responsáveis pelo crime de corrupção ativa no comércio internacional. Alarga ainda para 15 anos, o prazo de prescrição dos crimes de tráfico de influências e dos crimes de corrupção no comércio internacional e de corrupção privada.

A Lei 30/2015 de 22 de Abril, tem por objetivo acomodar as recomendações efetuadas a Portugal pelo GRECO (Grupo de Estados do Conselho da Europa Contra a Corrupção, no âmbito do II Ciclo de avaliações mútuas sobre a aplicação da Convenção Penal do Conselho da Europa sobre corrupção de 1999), pelas Nações Unidas (ONU, no quadro da aplicação da Convenção contra a corrupção de 2003, conhecida como Convenção de Mérida) e pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE, no âmbito da aplicação da Convenção contra a corrupção de agentes públicos estrangeiros nas transações comerciais internacionais de 1997), em matérias relacionadas com o combate à corrupção. Todas estas convenções já foram em devido tempo aprovadas por Resoluções da Assembleia da República e ratificadas por Decretos Presidenciais.

No tocante à moldura penal do crime de tráfico de influências para ato ilícito, esta foi agravada e alargou-se as previsões dos crimes de peculato e de peculato de uso, à apropriação ou uso, consoante os casos, de coisa imóvel. Para a coisa móvel, já desde o Código Penal de 1886 que tais incriminações estavam previstas.

Em relação às molduras penais dos crimes de corrupção passiva e ativa no setor privado, elevaram-se as molduras penais, bem como passou a existir punibilidade para a sua tentativa.

Saliente-se que algumas destas alterações introduzidas, já foram recomendadas a Portugal há alguns anos. Os nossos decisores políticos demoraram vários anos a verter na nossa legislação essas recomendações, mas como se costuma dizer, “mais vale tarde do que nunca”.

No universo das diversas alterações que surgem na citada lei, uma parece-me particularmente importante e de destacar: igualar as garantias dos denunciantes de infrações. Desde 2008 que apenas os trabalhadores da administração pública e de empresas do setor empresarial do Estado dispunham de determinadas garantias que os protegiam em caso de denúncias de infrações.

Entre outras, uma dessas garantias é o benefício do anonimato, até à dedução de acusação contra o infrator. A partir de agora também os trabalhadores do setor privado que denunciem infrações, podem passar a beneficiar dessas mesmas garantais. Sete anos (um absurdo) foi o tempo que os nossos decisores políticos levaram para perceber que também no setor privado deveriam existir mecanismos que protejam devidamente os denunciantes.

Apenas daqui por uns anos, é que podemos fazer um balanço destas alterações, se se revelaram muito ou pouco significativas e, se deveríamos ou não ter ido mais longe, sendo ou não mais incisivos em determinados pontos.

Mas uma coisa me parece sem qualquer dúvida fundamental realçar. A partir de agora ninguém tem desculpas para se tiver conhecimento de infrações cometidas, as não possa denunciar. A lei já protege igualmente todos os trabalhadores.

Cumpre agora cada um de nós fazer o seu papel, para podermos contribuir com a nossa quota-parte para uma sociedade mais justa e transparente e acabar de vez com este flagelo que é a corrupção.